30 Anos de um
Crime
27th/jan/2009 . 10:46 pm
artigo escrito em 1998
Ruy Medeiros.
Em 13 de dezembro de 1968, o país tomou conhecimento de outro crime da
ditadura militar. Diferentemente dos crimes de tortura contra presos políticos,
mantidos no silêncio compulsório e de divulgação proibida, o novo crime foi
amplamente divulgado. Vinha na voz de locutores e nas letras de jornais
censurados ou autocensurados em relação aos outros crimes.
Negavam os ditadores (muitos destes sobrevivem em atividade) a
existência de uma série de crimes. Negavam o sumiço que deram a presos
políticos, negavam as mortes sob tortura, negavam as prisões ilegais. Negavam
seus crimes hediondos, que se tornavam mais odiados porque praticados contra
pessoas que estavam presas e desarmadas. O crime só era comparável à covardia
de atentar contra pessoas postas em condição de mulheres e homens sem defesa.
O crime de 13 de dezembro de 1968 no entanto foi amplamente divulgado,
despudoradamente noticiado, trombeteado imoralmente. Era a mais nova obra do
regime que humilhava o nosso povo. Era a obra quase máxima dos boçais
ditadores, aqueles mesmos que diziam na sua (in) segurança de gorilas urbanos:
“A revolução é irreversível”. Grande merda a tal da revolução. Grande crime
contra o homem.
Em 13 de dezembro, desvergonhadamente, aqueles que assaltaram ao poder
baixavam o diktat contra pessoas:
- O ditador pode decretar o recesso do poder legislativo em todos os
seus níveis;
- O ditador, decretado o recesso, pode legislar em todas as matérias;
- O ditador pode intervir nos Estados e Municípios;
- O ditador, ouvido os seus comparsas, pode suspender direitos políticos
de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 anos;
- O ditador decreta que os que forem cassados em seus direitos políticos
ficam impedidos de votar e de serem votados, não podem se manifestar sobre
assunto político, podem ter sua liberdade vigiada (como se já não se vigiasse
todo mundo), serem proibidos de frequentar determinados lugares ou aos mesmos
pode ser dado domicílio determinado;
- O ditador ordena que poderá restringir exercício de outros direitos
aos que forem cassados;
- O ditador pode decretar as medidas referidas contra os cassados e a
apreciação da legalidade não pode ser verificada pelo judiciário;
- O ditador pode demitir, remover, aposentar e pôr em disponibilidade
servidores ou empregados públicos, e de empresas de economia mista;
- O ditador pode decretar o estado de sítio;
- O ditador poderá decretar confisco de bens aos que tenham enriquecido
ilicitamente no exercício de função pública ( pode…..);
- O ditador impõe que o habeas corpus não poderá ser usado em favor
daqueles que cometerem crimes políticos (isto é, em favor dos adversários do
regime não há habeas corpus);
- O ditador proibe aos senhores juízes de apreciarem seus atos e os de
seus comparsas adotados com base no ato institucional;
- Finalmente o ditador declara-se ditador para os que não tinham
entendido nada do que acontecera até então, na impossibilidade de declarar-se
um deus.
E os ditadores realmente continuaram em sua sanha de humilhar, proibir,
interditar, ofender, torturar.
Os torturadores receberam um espaço maior para torturarem e os censores
um campo mais alargado para censurarem, e os boçais do poder um espaço maior
para exercerem seu autoritarismo:
A partir de sua vigência ( da vigência do novo crime -Ato 5) 321 pessoas
tiveram seus mandatos políticos cassados; 100 deputados federais tiveram
direitos políticos suspensos por dez anos; 3 ministros do Supremo Tribunal
Federal foram aposentados compulsoriamente; professores e estudantes em grande
número foram expulsos das escolas; quase 500 apresentações teatrais foram
proibidas; centenas de livros não puderam circular; cerca de 500 letras de
músicas foram vetadas. Novelas, programas, notícias, quadros, etc. foram
censurados e impedidos de aparecerem. Mais de 1600 pessoas punidas. A partir de
13 de dezembro, o processo ditatorial aprofundou-se. processos criminais e
prisões aumentaram assustadoramente.
Enfim ( é difícil este “enfim” diante de tantos crimes), os ditadores
diziam que, não podendo ser um deus, contentavam-se em serem déspotas, apenas
déspotas, tão só déspotas, não confundam.
Tristes tempos a que escaparam as gerações presentes que, entretanto,
estão diante de novas formas de opressão.
Ato Institucional nº 5, longa lembrança para você a fim de que as
pessoas não esqueçam o que é o terror da ditadura.
P.S. Logo que terminei o artigo acima, recebo o jornal com notícia de
muitos outros crimes, um dos quais inominável: Relatório da CNBB denuncia que
há um milhão de nordestinos passando fome, em razão da última seca, apesar das
chuvas recentes. Triste tempo a que não escapa a geração presente.
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