terça-feira, 22 de maio de 2012


Alberto Farias: Um Registro
22nd/dez/2008 . 2:19 am 

Por Ruy Medeiros
Em meados da década de 50, a política conquistense pega fogo. A sucessão do prefeito Gerson Gusmão Sales não será tranquila. O prefeito fora eleito com o apoio de Dr. Regis Pacheco Pereira, pelo PSD. De início, parecia que as lideranças manteriam o equilíbrio e conseguiriam dissuadir maiores oposições ao poder local. Afinal, Dr. Regis Pacheco era uma liderança muito forte em Vitória da Conquista. Acumulara prestígio desde a década de 20, ampliado a partir de 1938 quando fora indicado Prefeito pelo interventor Landulpho Alves. Seu raio de ação aumentara com a sua eleição a Deputado Federal constituinte (1946) e, depois, a Governador do Estado da Bahia. Gerson Gusmão Sales, por sua vez, tinha já passado político antes de haver sido eleito prefeito municipal. Fora vereador na década de 30 e contava com extensa parentela bem situada na política local, que girava em torno de famílias tradicionais. O velho Justino Gusmão, patriarca da família, fora prefeito (de 1923 a 1925) e tecera uma rede de apoios políticos, nas décadas de 20 e 30, com Deraldo Mendes Ferraz. Com apoio de Dr. Regis Pacheco, Gerson Gusmão Sales tornara-se prefeito.
A aliança entre Dr. Regis Pacheco Pereira e Gerson Gusmão Sales não duraria muito. Quando da sucessão local, Gerson Gusmão Sales já havia controlado grandemente o PSD e conseguido apoio em outras forças. Aproximar-se-ia depois, também, do Governador Antonio Balbino (sucessor de Dr. Regis Pacheco no executivo estadual). Seu candidato à sucessão, Edvaldo Flores, não tinha o apoio de muitos partidários do Dr. Regis Pacheco, mas teve o apoio deste (que dizia apoiá-lo, por “ser homem de partido”). Resultado: Uma banda dos partidários de Dr. Regis Pacheco pulou para a candidatura de Nilton Gonçalves, lançado candidato pelo PTB, cujo diretório municipal era comandado pelo Sr. Enéas Miguez de Oliveira. A pugna eleitoral, desenvolvida entre Edvaldo Flores e Nilton Gonçalves, foi a chamada campanha do “tostão contra o milhão” (“tostão” era Nilton Gonçalves). As famílias tradicionais digladiavam-se. Porém novos agentes sociais, dentro da cidade em crescimento, já se expressavam, e o faziam sobretudo a favor do “tostão”. O populismo de Nilton Gonçalves não deixou de empolgar muita gente, com suas críticas ao atraso das oligarquias e ao exclusivismo familiar no mando local. Venceu Edvaldo Oliveira Flores. A gestão deste foi marcada por dura oposição. À medida que o tempo passava, ficava claro para a oposição que havia um projeto de Gerson Gusmão Sales para que seu grupo perpetuasse no poder. A luta política municipal de 1955 a 1962 foi muito renhida. As famílias dominantes, com o surgimento de novos agentes sociais, tentam adequar o discurso às novas circunstâncias e obter o apoio popular.
Nas eleições de 1958, Gerson Gusmão Sales apresentou-se como candidato a prefeito (agora pela UDN) e teve como opositor Dr. José Fernandes Pedral Sampaio (PSD). Apuradas as eleições, Gerson Gusmão Sales obteve 7.320 votos e Dr. José Fernandes Pedral Sampaio obteve 5.432 votos. A diferença (1.888 votos) era significativa. A oposição teria que redobrar esforços.
É neste quadro de crise de mando local e de fortes dissenções, que Dr. Alberto Alves Farias destacou-se como membro das oposições. Médico e componente da polícia militar estadual, chegara a Vitória da Conquista para dirigir a Companhia de Polícia Militar no Município.
Alberto Alves Farias, filho de Tolentino Alves de Farias e de Herondina Braga Farias, nasceu em Salvador, Bahia, em 1920. Ingressou na polícia militar e formou-se em Medicina, em Salvador. Veio para Vitória da Conquista na década de 50.
Dotado de vocação política, Alberto Farias identificou-se com a oposição conquistense. Para manter-se na cidade (pois havia ameaça de sua remoção) e considerando seu interesse político, Alberto Farias resolveu candidatar-se Vereador pela legenda do PSD, em 1954. Para isso conseguiu apoio de forças políticas na cidade, mas sobretudo de lideranças de Barra do Choça (então distrito de Vitória da Conquista), capitaneadas por Dr. Onildo Pereira de Oliveira e Leonídio Oliveira. Foi eleito e tornou-se vereador polêmico, combativo. Muitos o consideram o melhor vereador da história conquistense. No primeiro mandato formou bancada de oposição com Hercílio Lima, Jesus Gomes dos Santos, Aníbal Gonçalves e Evaristo José de Oliveira.
Ganhou muita notoriedade aquele vereador que não dava sossego aos adversários e que fiscalizava cada ato do Prefeito Municipal.
Nas eleições de 1958, sua popularidade já era grande. Conseguiu reeleger-se vereador com 1.068 votos (foi o vereador mais votado, então). Na câmara, liderava uma bancada composta por Gildásio Cairo dos Santos, Anfilófio Pedral Sampaio, Grimaldo Estrela de Oliveira e Jesus Gomes dos Santos.
Tal como ocorrera durante a gestão de Edvaldo Flores, em a nova gestão de Gerson Gusmão Sales, Alberto Farias foi o mais competente e combativo vereador. Polarizava as discussões na câmara e tinha eco nos jornais (inicialmente em “O Combate”, e, a partir, de 1959, em “O Conquistense”). Famosa foi sua luta, no âmbito da câmara, da imprensa e da justiça contra o aumento dos subsídios do prefeito (moveu ” ação popular” contra Edvaldo Oliveira Flores e obteve ganho de causa); contra o aumento do Imposto sobre Indústrias e Profissões, contra os vetos do executivo às emendas ao orçamento e contra o jogo do bicho.
Alberto Farias, quadro importante da política, discutia na câmara as questões com profundidade, mas não deixava de ser irônico. Exemplos: Dizia-se honrado com a inimizade do vereador Siloni Sales. Em certa sessão da câmara, foi apresentada uma mensagem, sem qualquer assinatura, concedendo à União Espírita Conquistense uma subvenção social. Ninguém informava como chegou a mensagem à câmara e, com isso, Alberto Farias comentou: “É coisa séria, afinal estão envolvidos espíritos”.
Na matéria de ironia, às vezes podia aproximar-se do Padre Palmeira, seu amigo, que comentando o “jogo do bicho” na cidade, saiu-se com esta: “Já não consigo reconhecer Conquista, nem a sua pacatez, devido aos urros da bicharia”.
Exemplo da atuação de Alberto Farias encontra-se em estudo dirigido à câmara, acompanhado de fotografias ( “Vitória da Conquista – 1958″) em que faz diagnóstico das carências do município.
À medida que se aprofundava na oposição local, também ia-se aproximando de idéias reformistas. Com Franklin Ferraz Neto (simpatizante do “partidão”) adquiriu, em junho de 1959, o jornal “O Conquistense” (órgão antes vinculado à “situação”).
“O Conquistense” passou a coesionar toda a oposição a Gerson Gusmão Sales, mesmo depois do acordo patrocinado por Juracy Magalhães para acomodar a situação conquistense ( “loteamento de cargos”- a coisa é antiga – entre os correligionários do Padre Palmeira e aqueles do Dr. Orlando Spínola). Por esse tempo (1959), setores do PSD/ PTB/UDN imaginavam a possibilidade de lançamento de Juracy Magalhães como candidato do “Nordeste” a Presidente da República, e aquele Governador baiano tentava “arrumar a própria casa”. A oposição conquistense (dúbia e contraditória) embarcava nesta idéia. Mas as tentativas de acomodação não vingaram. Os atritos entre o PSD e o Grupo de Gerson Sales (UDN/PTN) aumentaram. A situação tornou-se crítica. O Padre Palmeira, deputado estadual, dono de uma língua ferina, atiçava as brasas.
A situação agravou-se de tal maneira que, em fins de novembro de 1959, “O Conquistense”, alegando estar sendo ameaçado de “empastelamento” suspendeu sua circulação, enquanto que os vereadores oposicionistas (Alberto Farias, Anfilófio Fernandes Pedral Sampaio, Grimaldo Estrela e Jesus Gomes dos Santos) noticiaram à população que não frequentariam a câmara de vereadores porque se sentiam ameaçados por partidários do prefeito municipal.
Alberto Farias avançava no sentido de defender as “reformas de Base”, na década de 60.
A “briga” local seguiu até as eleições de 1962, em que a oposição, com Dr. José Fernandes Pedral Sampaio à frente, sagrou-se vitoriosa ( os vencidos voltariam à tona com o golpe de 1964, que destituiu o prefeito eleito em 1962).
Cumpriu Alberto Farias seu mandato de vereador integralmente (até início de 1963). Quando as oposições a Gerson Sales coligaram-se, Alberto Farias e Franklin Ferraz Neto integraram-se de corpo e alma na campanha eleitoral.
Em 1963, o Padre Palmeira foi feito Secretário de Educação e Cultura da administração de Lomanto Júnior (eleito Governador da Bahia nas eleições de 1962) e Alberto Farias foi chefe de gabinete daquele secretário. Porém, após o Golpe Militar de 1964, o Padre Palmeira perdeu a Secretaria (foi substituído por Dr. Paulo Américo, numa conjuntura em que Antonio Lomanto Júnior fora pressionado a alterar seu secretariado) e Alberto Farias deixou o cargo.
A quartelada de 1964 apressou a transferência de Alberto Farias para a reserva remunerada da polícia militar. O inquieto político, no entanto, gostava do estudo e do trabalho. De 1954 a 1958 trabalhara no Laboratório de Análises Clínicas fundado por Dr. Onildo Pereira de Oliveira (origem do Labo-Laboratório Oliveira Ltda”, hoje dirigido por Onildo Oliveira Filho). Dr. Onildo Pereira de Oliveira lembra a capacidade impressionante de trabalho e a lisura pessoal de Alberto Farias. Mas não é só; aproveitando recesso da câmara, foi a Salvador completar estudos de bioquímica do sangue, iniciados no Hospital das Clínicas de São Paulo.
Então, não seria de estranhar que se mantivesse no estudo e no trabalho: Aposentado, cursa a Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, cola grau em Biologia e continua a lecionar no Colégio da Bahia (Central), o que fez até 1990. Educou todos os seus filhos, os quais tem escolaridade em nível universitário.
Na madrugada de 14 de setembro último, debilitado (sobretudo a partir de derrame ocorrido em abril), o velho político faleceu no Hospital da Sagrada Família, em Salvador, Bahia, com 78 anos de idade.

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