Edivanda Maria Teixeira, Mestra e Líder
Ruy
Medeiros.
Há vinte
anos, e parece que foi ontem.
O dia 20 de
novembro de 1978 foi um dia triste, muito triste. Triste sobretudo para aqueles
que lutavam, especialmente para os que combatiam junto ao setor progressista
cristão e junto aos explorados.
Em 20 de
novembro de 1978, falecia, com 35 anos, Edivanda Maria Teixeira, filha de
Wanderley de Matos Teixeira e Guiomar de Souza Teixeira, nascida em 1943.
Desde jovem,
Edivanda Maria Teixeira ligou o seu destino ao destino das pessoas humildes.
Moça, quase menina, engajou-se no trabalho de alfabetização do MEB -Movimento
de Educação de Base, aquele processo de mobilização educativa que seria banido
pela ditadura militar imposta furiosamente contra o povo brasileiro em 1964.
Sua
trajetória de vida foi a do ensino e da luta; ou para usar a palavra do tempo:
sua vida era dedicada à conscientização das pessoas. Profundamente cristã,
assumia plenamente, ao contrário de outros, que seu papel era o de educar para
a liberdade e para a busca de justiça social. Isso a tornou próxima de pessoas
que não possuiam compromisso de luta a partir de convicções religiosas, mas
determinado por outras motivações.
No movimento
de nosso povo pela liberdade, pelo conhecimento e pela igualdade social, sob as
difíceis condições impostas pela ditadura militar, muitos se juntaram a partir
de motivações diferentes. A motivação presente em Edivanda era cristianismo
imbuído de compromisso com a necessidade de romper as amarras que impediam
nosso povo de conquistar o saber, a justiça e a igualdade.
Acompanhou -
e tantas vezes esteve à frente - aqueles que lutavam. Ajudou a organizar as
CEBS: Em 1969, na casa humilde de seu Geraldo, no bairro das Pedrinhas, nascia
a primeira Comunidade Eclesial de Base. O aguadeiro Geraldo reuniu algumas
pessoas, após diversos encontros com o Padre Luis Mosconi, e numa noite de
1969, um grupo foi formado para unir a meditação religiosa ao engajamento
social.
Naquele
tempo, o país vivia sob ditadura, pode-se dizer - sob a fase mais terrível do
regime militar. Era a época do império do Ato Institucional nº 5, imposto por
uma Junta Militar e sob o qual o ditador Garrastazu Médici governou.
O trabalho
das CEBS aos poucos foi crescendo. De início, o trabalho de educação mobilizava
em torno de coisas simples - campanha do filtro (educação sanitária básica), da
fossa, da limpeza. Mas, aos poucos, foi crescendo: reivindicação de escola,
professores, abastecimento d’água...
Edivanda
Maria Teixeira, que era professora e que tinha invulgar capacidade de
transmitir seu pensamento, educava com o auxílio dos próprios alunos. Quem eram
os alunos daquela escola sem livros e sem quadro negro? - Eram donas de casa,
domésticas, comerciárias, comerciários, desempregados - gente do povo. A
professora sobretudo perguntava, como se não soubesse nada, e ia desenvolvendo
análise, a partir das respostas. Assim, os presentes a cada reunião entendiam
que podiam aprender cada vez mais sobre si e sobre o mundo lá fora.
A luta das
CEBS crescia e o trabalho se avolumava para os padres ( Luís, Afonso, José...)
e para Edivanda. Não só as demandas aumentavam como as comunidades cresciam em número. Na zona rural
elas se multiplicaram e novas reivindicações próprias dos moradores do campo
passara m a ocorrer. Não se tratava
mais de apenas lutas urbanas. Porque logo as comunidades do campo, por toda a
área da Diocese, passara m a lutar
para colocar em prática suas reivindicações: luta por escola, por preço mínimo
de produtos, por aguadas, por assistência médica, por cumprimento de leis
trabalhistas, por aposentadoria.
Edivanda
Maria Teixeira era a principal agente dentro das Comunidades Eclesiais de Base.
Desdobrava-se para acompanhar o trabalho de todas. Em 1976, já existiam mais de
22 CEBS. E estas já realizavam encontros de animadores. O trabalho foi
evoluindo para a discussão de política, no sentido amplo. Para que o trabalho
tivesse unidade, foi criado o jornal mimeografado “Vai e Vem”, depois substituído pelo “Animador”.
De ambos, Edivanda foi redatora, organizadora. Até o número 36 do “Animador”,
junho de 1978, vê-se a presença de Edivanda Maria Teixeira. O jornal não
apenas sistematizava os dados do encontro anterior dos animadores das CEBS e
trazia suas resoluções, porque sua elaboração implicava em expor idéias com
clareza e indicar novos caminhos.
Com o avanço
da organização (em 1978 já havia mais de 33 CEBS), outros problemas
surgiram: As CEBS partiram para discutir
o papel dos sindicatos e dentro delas surgiu oposição sindical; passou a
debater a situação dos bóias frias e, desde 1975, envolveu-se na luta em favor
dos posseiros do Pau Brasil (Barra do Choça), que debatiam-se pela posse da
terra.
Apresentando
o nº 36 do “Animador”, Edivanda escreveu um texto que resume
pensamento vivo e crítico:
“Companheiro,
eis aqui
mais um número do nosso jornal. É vida vivida; a nossa vida sofrida, contada
nos encontros e escrita aqui.
O jornal
chega agora em suas mãos. Está nas mãos
de tantos companheiros. Abra as suas páginas, como se abre o coração de um
irmão.
Esse número
do nosso jornal sai mesmo no mês da fogueira e da Copa do Mundo. É mês quente!
E no meio deste fogo, de tanto barulho, de tanto grito, de tanta vibração, esse
nosso jornal quer ser um momento de parada, de espelho diante da realidade que
se vive. Ele quer ser um alerta prá gente não perder a cabeça com a bola e
esquecer a nossa luta.
Ele é o “Animador” que chega em boa hora. Você
encontrará palavras, gritos e cantos de um povo que quer se unir e se
organizar. Ele ajudará você a se sentir
“classe”, classe camponesa,
classe operária, onde o problema de um é de todos.
Leia com
calma! mastigue bem tudo! Não passe por cima das coisas!
Nele você
encontrará um povo que:
acorda
e “sacode a cabeça livre”
se une
luta com
teimosia
sofre derrotas
mas
vencerá....
Esse povo é
o melhor time do mundo no jogo da libertação, onde todos devem participar. Os
poderosos querem jogar sozinhos e ganhar sozinho. Desse jeito, o gol não vai na
trave! Não pode haver vibração! não pode haver vitória!
No campo da
vida, todos devem jogar. Todos são iguais! Todos devem ter oportunidades
iguais!
Qual o jogo
mais importante:
-É esse da
luta pela vida ou para ganhar a copa?
Transmita
aos outros os fatos, idéias e esperanças.
Bom
trabalho! Boa luta!”
Em 12 de
novembro de 1978, após um encontro de animadores, várias pessoas, dentre as
quais Edivanda, foram para uma celebração de Missa na Fazenda Pau Brasil. Como
sempre, Edivanda animou os camponeses da localidade, discutiu, cantou.
Incentivou-os na luta pela posse da terra.
De volta
para Vitória da Conquista, sentiu-se mal. Foi hospitalizada até o dia 16,
quando teve alta. Retornou para sua casa, mas, no dia 20 de novembro de 1978,
sofreu novo ataque cardíaco e faleceu.
Porisso 20
de novembro de 1978 foi um dia triste. Morreu uma grande líder e mestra do
movimento dos trabalhadores, que dissera:
“A vida do povo oprimido marcou para sempre minha vida. Não consigo mais
viver sem estar ao lado do povo para junto com ele lutar por um mundo mais
justo e mais irmão”.
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