quinta-feira, 24 de maio de 2012


                                               José Saramago



                                                                       Ruy Medeiros.



Alguns preferem  “Levantado do Chão”, outros querem  “Memorial do Convento”,  muitos são apaixonados por  “História do Cerco de Lisboa”,  mas há quem tenha sido marcado por  “Ensaio sobre a Cegueira”,  ou por o  “Ano da Morte de Ricardo Reis”. Penso em livros e leitores de José Saramago, hoje escritor do mundo.
José Saramago, ganhador do último prêmio Nobel de Literatura, nasceu em 1922, numa família de camponeses, em Azinhaga, Portugal. Escreveu peças de teatro ( “In Nomine Dei”),  contos  (“Objeto Quase”),  Crônicas ( “A Bagagem do Viajante”) e, sobretudo, grandes romances  ( “Levantado do Chão”,  “Memorial do Convento”,  “História do cerco de Lisboa”,  “O Ano da Morte de Ricardo Reis”,  “Todos os Nomes”,  etc).
A sua primeira obra literária a ter projeção foi o romance  “Levantado do Chão”,  pouco  lembrado por jornais e revistas em matérias que noticiaram o agraciamento daquele autor com o prêmio Nobel.  “Levantado do Chão” não é um livro menor: É a saga dos camponeses do Alentejo, seus sofrimentos e suas lutas. Costumo dizer que  “Levantado do Chão” é o irmão de  “Vinhas da Ira”,  de Steinbeck, e de  “A Lã e a Neve”,  de Ferreira de Castro. No livro, Saramago apenas anuncia seu estilo bem pessoal, que iria estar presente a partir de  “Memorial do Convento” e cuja realização maior  (a meu ver) encontra-se em  “O ano da Morte de Ricardo Reis”.  Não que este último seja seu melhor livro  (embora alguns digam que sim,  o belo e massacrante - ao mesmo tempo  -  “Ensaio sobre a Cegueira”,  pode disputar com  “Memorial do Convento”  o título de seu melhor livro).
Saramago, enquanto literata, é sobretudo romancista, porém sua obra de teatro, especialmente  “In Nomine Dei”,  tem importância, assim como seus contos, especialmente aqueles reunidos em  “Objeto Quase”.
Serão seus livros  (mesmo os  “romances históricos”,  ou assim impropriamente ditos) obra de denúncia?  Serão o pessimismo transformado em arte de dizer o mundo?  Serão a nova forma de realismo?  Serão o sentimento da frustração do artista no final do século XX?
Penso que José Saramago é o principal autor (dentre aqueles que conheço) da crise do mundo ( desde os anos 70), com os seus reflexos sobre o homem de sensibilidade. Mesmo seus livros que refletem o passado, deixam a impressão de que é o presente que importa: As formas de opressão ( física, intelectual, emotiva)  que persistem, as revoltas, a intolerância, o descontentamento, a resistência na adversidade, etc. Todo o pessimismo de José Saramago espelha condições de um mundo em crise.  “Ensaio sobre a Cegueira”,  no sentido da influência/introjeção da crise é o principal exemplo. A reflexão sobre a intolerância, aqui e alí em seus livros, é componente essencial e merece alentado ensaio.
O Saramago, filho de camponeses que ganhou celebridade internacional, não é autor que se contenta em contar histórias ( estórias) e que se rende ao gosto vigente. Tem personalidade, elabora bem o seu texto.
Não poderia, neste pequeno espaço, deixar, no entanto, de registrar ( enquanto leitor de Saramago, desde o lançamento, no Brasil,  de “Levantado do Chão”)  minha decepção com seus  “Diários de Lanzarote”,  recortes do cotidiano, de encontros literários, apreciações rápidas sobre pessoas, obras de arte, política, etc. Trata-se de obra menor.
Mas a decepção não me impediu de continuar seu leitor, mesmo antes do Prêmio Nobel de Literatura que, finalmente, descobriu que existe a língua portuguesa e que há bons autores que a cultuam.
E a descobriu através de um grande escritor. É claro que os brasileiros nunca aceitaram Carlos Drumond de Andrade ter falecido sem receber o Prêmio Nobel de Literatura, ou que João Cabral de Melo Neto não tenha sido o agraciado. Mas resta a lição de outro poeta que dizia ser a língua portuguesa sua pátria.

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