A LUTA DOS PROFESSORES MUNICIPAIS
Ruy Medeiros.
Quem
acompanha a luta dos professores municipais, mesmo aqueles que hoje se
encontram na posição de co-gestores do ensino, defronta-se com um problema
teórico-prático (prático do ponto de
vista da luta ou do atendimento às reivindicações, teórico quanto à formulação
e à resposta).
A luta pelo
respeito aos direitos anteriormente conquistados continua justa e atual?
À primeira
vista, parece ser coisa simples a
formulação da pergunta e o enunciado da resposta, porém trata-se de um problema
que tem adquirido complexidade teórico-prática. As próprias paralisações
ocorridas quanto à prestação do serviço público demonstram-no.
Para
embaralhar a situação, há o fato de que a maior parte dos sindicalistas que
dirige a categoria está no PT, mesmo partido do Prefeito, o professorado
municipal foi agente importantíssimo na eleição do atual mandatário municipal,
ex-dirigentes sindicais ocupam cargos comissionados junto à Secretaria de
Educação e a indicação da própria Secretaria de Educação passou por consulta a
professores. O PT, como sempre, está dividido em facções que disputam a
preponderância no aparelho partidário.
Então,
pergunta e resposta não obedecem a considerações tão simples. Po isso, tentemos
ver.
Numa
das “mesas redondas” de negociação entre
professores e a administração local, um funcionário graduado disse uma coisa
que parece muito importante: À administração anterior começou com política de
recuperação de salário e concedeu pequenas conquistas, mas estas ficaram só no
papel, porque agravou mesmo a situação à medida que atrasou sistematicamente
salários, deixou de pagá-los durante vários meses e causou prejuízo à categoria
docente. Poderia o funcionário ter acrescentado:
A
recuperação salarial voltou à estaca zero.
Assim
parecia que a coisa começara a aclarar-se: Há duas questões: direitos
adquiridos e direitos obedecidos na prática. Melhor ter o que se tem e receber,
do que ter e não receber, numa linguagem simples. Ou, mais ou menos, como dizia
um otimista conquistense: Tenho três camisas - esta que estou vestindo, uma que
vou comprar e outra que me prometeram. E não tirem a camisa que o homem está vestindo.
Tudo bem. Mas vamos impedí-lo de adquirir outra camisa menos surrada e evitar o
seu sonho de ter ainda uma outra, a domingueira?
Então
dizia-se da impossibilidade de aumento e de atendimento de algumas
reivindicações por parte da administração, por falta de dinheiro, e
respondia-se que outros administradores concederam direitos e não os pagaram
ou, no mínimo, fizeram coisa pior a partir de determinado momento: deixaram
mesmo de pagar salários. É inquestionável que deixar de pagar salários é coisa
hedionda. Não há eufemismo que resista.
A questão
deslocou-se, portanto: “Outros
concederam e não pagaram, nós não concedemos mais e pagamos o que está posto”.
Podia-se formular: “Mantemos como está e
pagaremos”. Muita coisa se disse da impossibilidade de cumprir com o piso
salarial (2,01 salários mínimos) e
repercussão disso sovbre os componentes da remuneração. No decorrer da “campanha salarial”, houve reposição parcial de 20% sobre o
salário base, com correspondente repercussão sobre as parcelas da remuneração.
Quer dizer: O deslocamento da questão não ficou obsolutizado, embora não tenha
a categoria docente alcançado o patamar de 2,01 salários mínimos como piso, que
recebera durante algum tempo (e que,
inclusive, foi fundamento para que a Justiça do trabalho reconhecesse
diferenças salariais em alentada reclamação trabalhista que se encontra em fase
de cálculos). O deslocamento (que
poderia servir como contra-ataque
partidário) demonstrou sua fragilidade na própria prática do movimento social
dos professores, pois foi removido com a recuperação parcial de 20%.
De qualquer
forma, o que foi dito passou a ser também um problema para a categoria dos
professores: A luta anterior por direitos fora esforço inútil porque
significara conquistar o que não podia ser cumprido pela administração
municipal? - Admitir a inutilidade da luta anterior ( de Luzinete a Marlúcia)
teria sido o mesmo que admitir ter sido
“justificável” a não continuação da política de recomposição (mesmo a gradativa) do “piso salarial” e do não atendimento de
alguns direitos que isso significa. Por outro lado, significaria igualmente que as administrações
anteriores aceitaram reconhecer direitos sob pressão, sabendo desde logo que
não poderiam pagar: O sindicato conquistava apenas no papel e lutava de novo
para receber. Mas a questão foi grandemente superada com o fato de ter sido
obtida a recuperação parcial de 20%. A luta não era um embuste do sindicato
contra os professores, em gestões passadas.
Hoje, a
partir da evolução das lutas dos professores, a pergunta deve ser re-posta
(reposta): As lutas anteriores foram corretas? A pergunta também deve ser
re-posta (reposta) em outros termos: É
realmente inviável à administração cumprir os ônus financeiros das conquistas
anteriores?
As respostas
são complexas. Implicam mesmo em saber se no tempo em que as “conquistas” foram obtidas, no papel, podiam
ser realmente atendidas. Isso revela uma questão política: O da seriedade dos
interlocutores e o da veracidade de informações dadas pelo poder público.
Sobreleva, no entanto, para os que lutam a velha questão de que cumpre ao
antagonista encontrar meios que atendam ao patamar das lutas. Fazer meios.
Ideologicamente, certos deslocamentos de questão são, no mínimo, embaraçosos:
A “inviabilidade de hoje do cumprimento
de direitos adquiridos justificaria o comportamento de administrações
anteriores? - Quanto aos salários a resposta deve ser imediata: O não pagamento
de salários ou o atraso de pagamento destes não têm justificativa. Quanto aos
demais direitos promessas, etc, é claro
que o poder público teria que viabilizar seu cumprimento, uma vez que foram
acordados.
É bom que
o “movimento dos professores” dê
resposta às questões a fim de que o não cumprimento de direitos, sob argumento
de impossibilidade, venha justificar o não cumprimento de direitos ontem. Ou
seja, deve-se evitar o raciocínio de que uma conquista que não se viabilizou na
prática (isto é, não foi respeitada
concretamente) foi errônea, e as lutas anteriores não foram bem conduzidas,
melhor assegurar-se o que se tem. O movimento docente encontrará a resposta
para isso.
É evidente que
haverá sempre quem diga que “antes um pássaro na mão que dois
voando”. Mas haverá quem diga que isso
atenta contra a liberdade dos pássaros e haverá ainda quem diga que é bom um
pássaro na mão enquanto se busca outro que está voando (por falar nisso, a simples figura não atenta
contra a ecologia...).
As respostas
devem ser obtidas para cada momento concreto, mas devem levar em conta que o
futuro (apesar da incerteza) é algo
concreto, as necessidades são concretas, as mudanças são obrigatórias para os “mudancistas”, estejam onde estiverem. A permanente questão
da contradição real, que se resolve pela forma, persiste e persistirá.
Nunca é
demais lembrar algumas coisas: As lutas dos professores (de Luzinete a Marlúcia) permitiram
construção de identidade, formulação de um padrão de relacionamento entre
professores e comunidade, persistência da auto-estima (mesmo quando continuada degradação salarial
foi imposta, ou a humilhação de bônus foi aplicada), criaram uma historicidade própria, refletiram
positivamente no processo educacional
(que seria do professor se a comunidade o visse como um panaca e se os
alunos o visualisassem como um cínico desprovido de auto-estima?) etc. Que
seria da educação conquistense se não houvesse pessoas lutando por melhores
condições salariais ao mesmo tempo em que estavam pugnando por melhor educação?
Há uma
historicidade rica de efeitos e consequências que não pode ser esmagada por
qualquer conveniência partidária.
Trabalhar a
forma, querendo trabalhá-la, amando o trabalho de fazê-lo - é o caminho: Tarefa
do movimento sob Luciene.
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