quinta-feira, 24 de maio de 2012


A LUTA DOS PROFESSORES MUNICIPAIS



                                                           Ruy Medeiros.


Quem acompanha a luta dos professores municipais, mesmo aqueles que hoje se encontram na posição de co-gestores do ensino, defronta-se com um problema teórico-prático  (prático do ponto de vista da luta ou do atendimento às reivindicações, teórico quanto à formulação e à resposta).
A luta pelo respeito aos direitos anteriormente conquistados continua justa e atual?
À primeira vista,  parece ser coisa simples a formulação da pergunta e o enunciado da resposta, porém trata-se de um problema que tem adquirido complexidade teórico-prática. As próprias paralisações ocorridas quanto à prestação do serviço público demonstram-no.
Para embaralhar a situação, há o fato de que a maior parte dos sindicalistas que dirige a categoria está no PT, mesmo partido do Prefeito, o professorado municipal foi agente importantíssimo na eleição do atual mandatário municipal, ex-dirigentes sindicais ocupam cargos comissionados junto à Secretaria de Educação e a indicação da própria Secretaria de Educação passou por consulta a professores. O PT, como sempre, está dividido em facções que disputam a preponderância no aparelho partidário.
Então, pergunta e resposta não obedecem a considerações tão simples. Po isso, tentemos ver.
Numa das  “mesas redondas” de negociação entre professores e a administração local, um funcionário graduado disse uma coisa que parece muito importante: À administração anterior começou com política de recuperação de salário e concedeu pequenas conquistas, mas estas ficaram só no papel, porque agravou mesmo a situação à medida que atrasou sistematicamente salários, deixou de pagá-los durante vários meses e causou prejuízo à categoria docente. Poderia o funcionário ter acrescentado:
A recuperação salarial voltou à estaca zero.
Assim parecia que a coisa começara a aclarar-se: Há duas questões: direitos adquiridos e direitos obedecidos na prática. Melhor ter o que se tem e receber, do que ter e não receber, numa linguagem simples. Ou, mais ou menos, como dizia um otimista conquistense: Tenho três camisas - esta que estou vestindo, uma que vou comprar e outra que me prometeram. E não tirem a camisa que o homem está vestindo. Tudo bem. Mas vamos impedí-lo de adquirir outra camisa menos surrada e evitar o seu sonho de ter ainda uma outra, a domingueira?
Então dizia-se da impossibilidade de aumento e de atendimento de algumas reivindicações por parte da administração, por falta de dinheiro, e respondia-se que outros administradores concederam direitos e não os pagaram ou, no mínimo, fizeram coisa pior a partir de determinado momento: deixaram mesmo de pagar salários. É inquestionável que deixar de pagar salários é coisa hedionda. Não há eufemismo que resista.
A questão deslocou-se, portanto:  “Outros concederam e não pagaram, nós não concedemos mais e pagamos o que está posto”. Podia-se formular:  “Mantemos como está e pagaremos”. Muita coisa se disse da impossibilidade de cumprir com o piso salarial  (2,01 salários mínimos) e repercussão disso sovbre os componentes da remuneração. No decorrer da  “campanha salarial”,  houve reposição parcial de 20% sobre o salário base, com correspondente repercussão sobre as parcelas da remuneração. Quer dizer: O deslocamento da questão não ficou obsolutizado, embora não tenha a categoria docente alcançado o patamar de 2,01 salários mínimos como piso, que recebera durante algum tempo  (e que, inclusive, foi fundamento para que a Justiça do trabalho reconhecesse diferenças salariais em alentada reclamação trabalhista que se encontra em fase de cálculos). O deslocamento  (que poderia  servir como contra-ataque partidário) demonstrou sua fragilidade na própria prática do movimento social dos professores, pois foi removido com a recuperação parcial de 20%.
De qualquer forma, o que foi dito passou a ser também um problema para a categoria dos professores: A luta anterior por direitos fora esforço inútil porque significara conquistar o que não podia ser cumprido pela administração municipal? - Admitir a inutilidade da luta anterior ( de Luzinete a Marlúcia) teria sido o mesmo que admitir ter sido  “justificável” a não continuação da política de recomposição  (mesmo a gradativa) do  “piso salarial” e do não atendimento de alguns direitos que isso significa. Por outro lado,  significaria igualmente que as administrações anteriores aceitaram reconhecer direitos sob pressão, sabendo desde logo que não poderiam pagar: O sindicato conquistava apenas no papel e lutava de novo para receber. Mas a questão foi grandemente superada com o fato de ter sido obtida a recuperação parcial de 20%. A luta não era um embuste do sindicato contra os professores, em gestões passadas.
Hoje, a partir da evolução das lutas dos professores, a pergunta deve ser re-posta (reposta): As lutas anteriores foram corretas? A pergunta também deve ser re-posta (reposta) em outros termos:  É realmente inviável à administração cumprir os ônus financeiros das conquistas anteriores?
As respostas são complexas. Implicam mesmo em saber se no tempo em que as  “conquistas” foram obtidas, no papel, podiam ser realmente atendidas. Isso revela uma questão política: O da seriedade dos interlocutores e o da veracidade de informações dadas pelo poder público. Sobreleva, no entanto, para os que lutam a velha questão de que cumpre ao antagonista encontrar meios que atendam ao patamar das lutas. Fazer meios. Ideologicamente, certos deslocamentos de questão são, no mínimo, embaraçosos: A  “inviabilidade de hoje do cumprimento de direitos adquiridos justificaria o comportamento de administrações anteriores? - Quanto aos salários a resposta deve ser imediata: O não pagamento de salários ou o atraso de pagamento destes não têm justificativa. Quanto aos demais direitos promessas, etc,  é claro que o poder público teria que viabilizar seu cumprimento, uma vez que foram acordados.
É bom que o  “movimento dos professores” dê resposta às questões a fim de que o não cumprimento de direitos, sob argumento de impossibilidade, venha justificar o não cumprimento de direitos ontem. Ou seja, deve-se evitar o raciocínio de que uma conquista que não se viabilizou na prática  (isto é, não foi respeitada concretamente) foi errônea, e as lutas anteriores não foram bem conduzidas, melhor assegurar-se o que se tem. O movimento docente encontrará a resposta para isso.
É evidente que haverá sempre quem diga  que   “antes um pássaro na mão que dois voando”.  Mas haverá quem diga que isso atenta contra a liberdade dos pássaros e haverá ainda quem diga que é bom um pássaro na mão enquanto se busca outro que está voando  (por falar nisso, a simples figura não atenta contra a ecologia...).
As respostas devem ser obtidas para cada momento concreto, mas devem levar em conta que o futuro  (apesar da incerteza) é algo concreto, as necessidades são concretas, as mudanças são  obrigatórias para os  “mudancistas”,  estejam onde estiverem. A permanente questão da contradição real, que se resolve pela forma, persiste e persistirá.
Nunca é demais lembrar algumas coisas: As lutas dos professores  (de Luzinete a Marlúcia) permitiram construção de identidade, formulação de um padrão de relacionamento entre professores e comunidade, persistência da auto-estima  (mesmo quando continuada degradação salarial foi imposta, ou a humilhação de bônus foi aplicada),  criaram uma historicidade própria, refletiram positivamente no processo educacional  (que seria do professor se a comunidade o visse como um panaca e se os alunos o visualisassem como um cínico desprovido de auto-estima?) etc. Que seria da educação conquistense se não houvesse pessoas lutando por melhores condições salariais ao mesmo tempo em que estavam pugnando por melhor educação?
Há uma historicidade rica de efeitos e consequências que não pode ser esmagada por qualquer conveniência partidária.
Trabalhar a forma, querendo trabalhá-la, amando o trabalho de fazê-lo - é o caminho: Tarefa do movimento sob Luciene.

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