Monumento ao Índio
Ruy
Medeiros(Digitado, 04/1999)
Jornais noticiam que o
Movimento Contra a Morte Prematura teve a iniciativa de construção de um
monumento ao Índio. Seria homenagem aos primitivos habitantes do Planalto da
Conquista.
Tem sentido a homenagem.
Em verdade, há certa
curiosidade em torno dos índios que habitaram o Planalto da Conquista. A
história da região ficou encoberta durante muito tempo e, de certo modo, assim
continua. Então, trata-se mesmo de descobrir a história, inclusive a história
dos índios. Descobrir o que a ideologia, a lenda e a história dos vencedores
encobriram.
Sente-se difusamente
que, debaixo da “guerra justa” contra os indígenas, houve verdadeiramente um
genocídio. Alguma coisa terrível, além de simples reação contra ataques ou de
defesa, ocorreu. É disso que se desconfia. Assim as pessoas começam a imaginar.
E, realmente. O
monumento aparece como memória, necessidade de mostrar que o índio existiu e
instiga a perguntar porque não mais existe. Ajuda ao processo do descobrimento
e este aos poucos emerge com o estudo de fontes. No entanto, a não
especificação de “quais índios” pode tornar a homenagem genérica, sem impacto,
maior que a especificação traz. É de imaginar que seria importante que algum
aspecto da obra sugerisse que se trata de monumento aos Mongoyós, Imborés e
Pataxós, homens que aqui viveram e lutaram.
E, realmente, um dia a
vasta região que abrange o Planalto da Conquista, a Encosta do Planalto e a
área pastoril de Itapetinga esteve povoada de indígenas do tronco Macro-Jê. São
estes: Mongoyós (da família Kamakã), Imborés (Aymorés, família do mesmo nome) e
Pataxós (da família Maxacali).
De todos aqueles, os
Mongoyós eram os que possuíam cultura mais adiantada e também maior população (
a julgar-se pelas fontes disponíveis).
Por força de guerras,
fome e doenças, os indígenas desapareceram do Planalto da Conquista, da Encosta
do Planalto e da área Pastoril de Itapetinga. Desapareceram? Não. Isto é
eufemismo. Foram trucidados, exterminados. “Varridos”, como disse um autor no
final do século XIX, também é um eufemismo.
Quando se lembra que a
população Mongoyó era superior a dois mil e que os invasores eram bem poucos,
de início, pode-se quilatar o que ocorreu para que não restasse um último
Mongoyó. Nenhum vivo. Kurt Nimuendaju deixou um registro, em carta, de que
teria visto os últimos Mongoyós, na década de 20 deste século. Que ocorreu com
eles? - Misturaram-se a Pataxós? Morreram nos combates dos índios da Reserva
Catarina Paraguassú contra os brancos na década de 30? A história ainda não
respondeu.
A guerra contra os
indígenas foi dura, desleal e desigual. As fontes históricas aos poucos vão
desvendando os ataques de surpresa com homens munidos de armas mais potentes
que a lança, o arco e a flecha. Poucos escaparam: alguns imborés foram
reduzidos em missão religiosa durante algum tempo. Depois mudaram-se para
desaparecerem. Não se pode dizer com certeza que pertencem a remanescentes
Aymorés do Espírito Santo.
Os Pataxós que
sobreviveram às lutas armadas encostaram-se no litoral e aí sobrevivem, mas seu
dialeto está extinto (restam algumas poucas palavras). Encontram-se em Barra Velha , em
Imbiriba (Porto Seguro), Águas Belas (Prado), Mata Medonha (Santa Cruz de
Cabrália), Trevo do Parque (Itamaraju), Coroa Vermelha (Santa Cruz de
Cabrália), Reserva Catarina Paraguassú (Pau Brasil, Camacã e Itaju do Colônia).
Aí lutam pela sobrevivência. Alguns ainda necessitam de ter terra demarcada.
A notícia da criação do
monumento, por iniciativa de André Cairo e de seu Movimento Contra a Morte
Prematura, termina por evocar uma história em grande parte ainda encoberta, mas
que pode ser grandemente descoberta, porque (contrariamente ao que se pensa)
são abundantes as fontes documentais sobre os índios que habitaram o Planalto
da Conquista e seus patamares de acesso. Aos poucos, isso vem ocorrendo.
Exemplo de bom estudo
que, dentre outras coisas, estuda os índios de nossa região frente à política
de “branco”, é a tese de doutorado da Professora Maria Hilda Baqueiro, que
merece ser publicada. Seria muito bom que a UESB ou o Município de Vitória da
Conquista tomassem a iniciativa de contatarem com mencionada professora para
editarem sua obra - “O Tempo da Dor e do Trabalho - A Conquista dos Territórios
indígenas nos sertões do leste” (Tese apresentada para obtenção de título de
doutor em História
Social , na USP, aprovada com nota 10 e louvor) .
Afinal, a história
sempre merece ser descoberta para tornar-se realmente História
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