O CERCO DA
CÂMARA
15th/jan/2009 . 10:15 pm
Ruy Medeiros
artigo escrito em 1999
Na política, o visível aparece como atividade e o invisível como
análise, ou objeto de análise.
Em Vitória da Conquista um fato dos mais visíveis é a atuação da Câmara
Municipal e, dentro desta, a atividade da maioria.
Não importa se a visibilidade da Câmara é merecida ou não. O fato é que
tem aparecido como principal fato político local (embora não o seja). O
importante, de qualquer maneira, é verificar-se como e porque ocorre tal
visibilidade.
As relações entre maioria e minoria nas câmaras que fazem leis, assim
como o relacionamento entre aqueles blocos e o executivo, sempre tiveram
importância no quadro institucional e, neste sentido, obtiveram uma grande
visibilidade. Que o diga Fernando Collor de Melo, que viveu uma experiência em
que a câmara dos Deputados apareceu em plano privilegiado na mídia durante as
investigações da corrupção em seu Governo, embora os meios de comunicação e a
juventude tivessem feito muito mais para que, finalmente, deputados tomassem
posições contra o Governo.
Ora, o que implica, mesmo diante de análise rápida, é o fato de a
atuação da maioria na câmara ocupar tanto espaço de visibilidade. Não há maior
brilhantismo aí que justifique tanto aparecimento: Maioria e minoria fazem o trabalho que julgam
adequado. Alguns pretendem mesmo que estão desempenhando o mandato com pleno
respeito à confiabilidade que lhes foi depositada nas urnas. O problema não é
de caráter pessoal. Para repetir o lugar comum conscientemente: o problema é
político.
A maioria tem-se utilizado do ataque a varejo às atividades do
executivo, e de forma desconcertante para a minoria (inclusive para a liderança
do Prefeito) tem transformado questões secundárias em questões fundamentais ou,
nas questões fundamentais, tem discutido o problema a partir do ângulo menos
importante. Muito tempo e muitanotícia gerou um fato como
o da legitimidade ou não ( ou legalidade, ou não, para alguns) do uso de
logomarca distintivo da atual administração. Mesmo que essa coisinha tivesse
sido anunciada com estardalhaço por pessoas que conviveram com prática
semelhante em administrações passadas, em aprovador silêncio, a coisinha tomou
uma dimensão extraordinária, digna do reaparecimento do gigante Adamastor.
Na importante questão do transporte coletivo (questão que merece
permanecer em manchetes), não se discute o principal: a) A total ilegalidade em
que se encontra a autodenominada “permissionária” do serviço público de
transporte coletivo (onde o leitor já viu “permissão” que se sucede e que dura
mais de trinta anos?); b) A demanda da população por um serviço melhor, mais
massivo, de qualificação continuada; c) Os níveis de controle da população
sobre o serviço e o tipo de serviço prestado; d) O plano de expansão futura de
serviço de transporte coletivo de passageiros ( é possível, por exemplo, criar
condições para futura implantação de duas linhas básicas de metrô de superfície
para a cidade extensa que é Vitória da Conquista?); e) De quem é a
responsabilidade pelo não funcionamento do Conselho Municipal de Transporte
Coletivo?
Quanto à questão vital de transporte coletivo o que se vê são medidas
capazes de protelarem uma situação insustentável e que porisso mesmo tende a
agravar-se. Qualquer medida que perpetue a ilegal permissão agravará o
problema.
São exemplos. Outros existem.
É claro que algumas sessões especiais atingiram o objetivo para a qual
foram convocadas, chegando a atingirem algum nível de profundidade na discussão
da matéria de pauta. Mas a idéia da “Câmara “Itinerante””, que parecia alargar
o espaço de institucionalidade da vereança, cada vez mais resvala para o nível
de comício eleitoral: ataques e defesas. O objetivo de conhecer e analisar
situações é jogado para escanteio. Mesmo para quem aceita a política
institucional como centro de tática política deve estar pensando se não é ora
de “repensar” a atividade denominada “Câmara Itinerante”.
Então, os ataques a varejo e a transformação do secundário em principal
tem o dom de afastar a discussão de questões fundamentais para Vitória da
Conquista: a) O que os representantes da comunidade conquistense têm a dizer
sobre o tratamento que o Governo do Estado defere ao Município de Vitória da
Conquista e que tratamento deve ser dispensado a este; b) Quais devem ser as
linhas mestras de Planejamento do desenvolvimento urbano; c) Como Vitória da
Conquista deve implementar um plano de saneamento básico, com diretrizes e
objetivos; d) Como a câmara pode atuar diante da miséria, fome e desemprego que
campeiam em Vitória da Conquista; e) Que tipo e abrangência de educação se quer
para Vitória da Conquista; f) Qual a função da vereança num Município em crise,
etc, etc.
A maioria faz o trabalho que acha que deve ser feito, embora o faça sem
maior profundidade analítica e transforme questões menores em problemas
maiores.
Diante disso, surpreende o comportamento da minoria: Esta não tem
iniciativa política, aceita a discussão em o nível proposto pela maioria,
mantém-se na defensiva.
A impressão que se tem é que à minoria falta um anteparo partidário que
discuta as questões com profundidade e politicamente.
Neste espaço, não se coloca em dúvida a competência de qualquer
vereador. Não é o caso de discutir-se, aqui, essa matéria.
O que, em verdade, pode-se notar é que falta projeto político mais amplo
para Vitória da Conquista entre os vereadores.
A maioria, herdeira de forças que se desgastaram nas últimas
administrações e oriunda de partidos cujo único traço de união é a oposição à
administração local, não se aventura a lanços maiores de propor projeto mais
abrangente para a cidade. Não o tem sequer. Trata-se de uma oposição que no
decorrer da história recente não construiu um projeto para o município,
preferindo deixar isso para a improvisação daquele que ocupasse o mando local.
Para sobreviver, realizou alianças que tiveram o preço de certa desfiguração
política.
A minoria também não deslancha. Fica no lugar comum da resposta aos
questionamentos da maioria. Com isso, abre a alternativa para que a câmara seja
o centro organizado da oposição ao executivo, num momento em que as últimas
eleições deixaram bem claras as limitações dos partidos que foram derrotados na
eleição majoritária (prefeito) com uma intensidade há muito não vista por aqui.
Ou seja, na inexistência de partidos que conduzam a oposição, esta escoa apenas
para dentro da câmara e age à vontade em seu trabalho (o trabalho de oposição é
fazer oposição), enquanto que a minoria não entende o que ocorre e, com isso,
ajuda a rearticulação de forças antes derrotadas.
O apequenamento das discussões políticas se instala, portanto.
Tudo isso se resume em uma palavra: crise.
A maioria não apresenta projeto amplo, que contemple as questões
fundamentais, mesmo na forma como as pode compreender a institucionalidade, ou
seja: mesmo dentro da institucionalidade que castra, as “forças” políticas da
maioria não articulam um discurso amplo aceito pela institucionalidade. A suposta
esquerda que a minoria representaria, limita-se pela institucionalidade e sua
falta de iniciativa sequer permite que esta seja alargada. Também não constrói
projeto amplo.
O que acontecerá, não se sabe.
Pode ser que a maioria seja derrotada pelo esgotamento do ciclo de
ataques ao varejo, diante da ofensiva administrativa do executivo. Pode ser que
a minoria resolva pensar politicamente e partir para a iniciativa. As eleições
próximas tendem a modificar um tanto os debates, com repercussão no comportamento
futuro das bancadas.
Mas, de qualquer maneira, o cenário na câmara deixa claro que é uma
imprecisão dizer, como repete um secretário municipal, que Vitória da Conquista
presencia o fim de um ciclo histórico municipal, como se a atuação na
institucionalidade fosse suficiente para patrocinar cortes profundos na
realidade. Jadiel Matos também teve a pretensão de ser fim de ciclo e
ironicamente a contragosto tornou-se traço de união de dois momentos. Todo o
cuidado é pouco. Uma questão persiste: A institucionalidade é insuficiente.
Hoje, este problema, é fundamental para a esquerda. Como atuar politicamente
fora dos limites institucionais.
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