terça-feira, 22 de maio de 2012


O CERCO DA CÂMARA
15th/jan/2009 . 10:15 pm 

Ruy Medeiros
artigo escrito em 1999
Na política, o visível aparece como atividade e o invisível como análise, ou objeto de análise.
Em Vitória da Conquista um fato dos mais visíveis é a atuação da Câmara Municipal e, dentro desta, a atividade da maioria.
Não importa se a visibilidade da Câmara é merecida ou não. O fato é que tem aparecido como principal fato político local (embora não o seja). O importante, de qualquer maneira, é verificar-se como e porque ocorre tal visibilidade.
As relações entre maioria e minoria nas câmaras que fazem leis, assim como o relacionamento entre aqueles blocos e o executivo, sempre tiveram importância no quadro institucional e, neste sentido, obtiveram uma grande visibilidade. Que o diga Fernando Collor de Melo, que viveu uma experiência em que a câmara dos Deputados apareceu em plano privilegiado na mídia durante as investigações da corrupção em seu Governo, embora os meios de comunicação e a juventude tivessem feito muito mais para que, finalmente, deputados tomassem posições contra o Governo.
Ora, o que implica, mesmo diante de análise rápida, é o fato de a atuação da maioria na câmara ocupar tanto espaço de visibilidade. Não há maior brilhantismo aí que justifique tanto aparecimento: Maioria e minoria fazem o trabalho que julgam adequado. Alguns pretendem mesmo que estão desempenhando o mandato com pleno respeito à confiabilidade que lhes foi depositada nas urnas. O problema não é de caráter pessoal. Para repetir o lugar comum conscientemente: o problema é político.
A maioria tem-se utilizado do ataque a varejo às atividades do executivo, e de forma desconcertante para a minoria (inclusive para a liderança do Prefeito) tem transformado questões secundárias em questões fundamentais ou, nas questões fundamentais, tem discutido o problema a partir do ângulo menos importante. Muito tempo e muitanotícia gerou um fato como o da legitimidade ou não ( ou legalidade, ou não, para alguns) do uso de logomarca distintivo da atual administração. Mesmo que essa coisinha tivesse sido anunciada com estardalhaço por pessoas que conviveram com prática semelhante em administrações passadas, em aprovador silêncio, a coisinha tomou uma dimensão extraordinária, digna do reaparecimento do gigante Adamastor.
Na importante questão do transporte coletivo (questão que merece permanecer em manchetes), não se discute o principal: a) A total ilegalidade em que se encontra a autodenominada “permissionária” do serviço público de transporte coletivo (onde o leitor já viu “permissão” que se sucede e que dura mais de trinta anos?); b) A demanda da população por um serviço melhor, mais massivo, de qualificação continuada; c) Os níveis de controle da população sobre o serviço e o tipo de serviço prestado; d) O plano de expansão futura de serviço de transporte coletivo de passageiros ( é possível, por exemplo, criar condições para futura implantação de duas linhas básicas de metrô de superfície para a cidade extensa que é Vitória da Conquista?); e) De quem é a responsabilidade pelo não funcionamento do Conselho Municipal de Transporte Coletivo?
Quanto à questão vital de transporte coletivo o que se vê são medidas capazes de protelarem uma situação insustentável e que porisso mesmo tende a agravar-se. Qualquer medida que perpetue a ilegal permissão agravará o problema.
São exemplos. Outros existem.
É claro que algumas sessões especiais atingiram o objetivo para a qual foram convocadas, chegando a atingirem algum nível de profundidade na discussão da matéria de pauta. Mas a idéia da “Câmara “Itinerante””, que parecia alargar o espaço de institucionalidade da vereança, cada vez mais resvala para o nível de comício eleitoral: ataques e defesas. O objetivo de conhecer e analisar situações é jogado para escanteio. Mesmo para quem aceita a política institucional como centro de tática política deve estar pensando se não é ora de “repensar” a atividade denominada “Câmara Itinerante”.
Então, os ataques a varejo e a transformação do secundário em principal tem o dom de afastar a discussão de questões fundamentais para Vitória da Conquista: a) O que os representantes da comunidade conquistense têm a dizer sobre o tratamento que o Governo do Estado defere ao Município de Vitória da Conquista e que tratamento deve ser dispensado a este; b) Quais devem ser as linhas mestras de Planejamento do desenvolvimento urbano; c) Como Vitória da Conquista deve implementar um plano de saneamento básico, com diretrizes e objetivos; d) Como a câmara pode atuar diante da miséria, fome e desemprego que campeiam em Vitória da Conquista; e) Que tipo e abrangência de educação se quer para Vitória da Conquista; f) Qual a função da vereança num Município em crise, etc, etc.
A maioria faz o trabalho que acha que deve ser feito, embora o faça sem maior profundidade analítica e transforme questões menores em problemas maiores.
Diante disso, surpreende o comportamento da minoria: Esta não tem iniciativa política, aceita a discussão em o nível proposto pela maioria, mantém-se na defensiva.
A impressão que se tem é que à minoria falta um anteparo partidário que discuta as questões com profundidade e politicamente.
Neste espaço, não se coloca em dúvida a competência de qualquer vereador. Não é o caso de discutir-se, aqui, essa matéria.
O que, em verdade, pode-se notar é que falta projeto político mais amplo para Vitória da Conquista entre os vereadores.
A maioria, herdeira de forças que se desgastaram nas últimas administrações e oriunda de partidos cujo único traço de união é a oposição à administração local, não se aventura a lanços maiores de propor projeto mais abrangente para a cidade. Não o tem sequer. Trata-se de uma oposição que no decorrer da história recente não construiu um projeto para o município, preferindo deixar isso para a improvisação daquele que ocupasse o mando local. Para sobreviver, realizou alianças que tiveram o preço de certa desfiguração política.
A minoria também não deslancha. Fica no lugar comum da resposta aos questionamentos da maioria. Com isso, abre a alternativa para que a câmara seja o centro organizado da oposição ao executivo, num momento em que as últimas eleições deixaram bem claras as limitações dos partidos que foram derrotados na eleição majoritária (prefeito) com uma intensidade há muito não vista por aqui. Ou seja, na inexistência de partidos que conduzam a oposição, esta escoa apenas para dentro da câmara e age à vontade em seu trabalho (o trabalho de oposição é fazer oposição), enquanto que a minoria não entende o que ocorre e, com isso, ajuda a rearticulação de forças antes derrotadas.
O apequenamento das discussões políticas se instala, portanto.
Tudo isso se resume em uma palavra: crise.
A maioria não apresenta projeto amplo, que contemple as questões fundamentais, mesmo na forma como as pode compreender a institucionalidade, ou seja: mesmo dentro da institucionalidade que castra, as “forças” políticas da maioria não articulam um discurso amplo aceito pela institucionalidade. A suposta esquerda que a minoria representaria, limita-se pela institucionalidade e sua falta de iniciativa sequer permite que esta seja alargada. Também não constrói projeto amplo.
O que acontecerá, não se sabe.
Pode ser que a maioria seja derrotada pelo esgotamento do ciclo de ataques ao varejo, diante da ofensiva administrativa do executivo. Pode ser que a minoria resolva pensar politicamente e partir para a iniciativa. As eleições próximas tendem a modificar um tanto os debates, com repercussão no comportamento futuro das bancadas.
Mas, de qualquer maneira, o cenário na câmara deixa claro que é uma imprecisão dizer, como repete um secretário municipal, que Vitória da Conquista presencia o fim de um ciclo histórico municipal, como se a atuação na institucionalidade fosse suficiente para patrocinar cortes profundos na realidade. Jadiel Matos também teve a pretensão de ser fim de ciclo e ironicamente a contragosto tornou-se traço de união de dois momentos. Todo o cuidado é pouco. Uma questão persiste: A institucionalidade é insuficiente. Hoje, este problema, é fundamental para a esquerda. Como atuar politicamente fora dos limites institucionais.

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