Olhar sobre a serra do Piripiri
Ruy
Medeiros
(Para Valter Rocha, que
ama e conhece a serra). (Digitado, 05/1999)
O nome é
tupi, embora a terra tenha sido Kamakã-Mongoyó: Piripiri significa junco. Na
região há alguns juncos: Tabúa, taquara, taquarinha, criciúma. Piripiri é como
se fosse muito junco, juncal, ou muita taquara, taquaral. Em língua tupi a
repetição do substantivo dá-lhe o significado de aumentativo, multiplicação,
maior frequência. Uma extensão de piri é piripiri. A palavra piripiri foi
incorporada à língua portuguesa com os dois significados: o de junco, taquara,
tabúa ou o de brejo. Em alguns lugares persiste apenas o significado de brejo
com vegetação de um dos tipos de junco ( tabúa, principalmente), para a palavra
piripiri. Ocorreu, assim, u’a metonímia
( no sentido diacrônico, como o termo é aplicado para indicar mudança de
significado da palavra pela semântica histórica) (1).
Em nossa
região há vários sítios com o nome de piripiri. O sítio da cidade de Planalto
chamava-se Piripiri Grande; há o Piripirizinho ou Piripiri Pequeno na encosta
noroeste da serra do Piripiri; há outro Piripiri em Iguá, e outros mais. Enfim,
há muitos sítios que derivaram seu nome de um piripiri, isto é, de um brejo,
com tabúa geralmente.
A serra do
Piripiri é, no dizer de Alfredo José Porto Domingues, um monadnock alongado,
que é remanescente ( “testemunho”) de uma superfície mais antiga (2). É que
todo o planalto da Conquista representa uma superfície de erosão e seus
monadnocks “testemunham” de certa forma
como era a superfície anterior (3).
A vegetação
ora é simplesmente uma vegetação rasteira (gramas, Sianinha, Palito-de-doutor,
musgos, etc), ora de pequeno porte (Cambui,
Araça-mirim, Azedinha, etc), arbustiva, ou composta de espécies
presentes em Mata-de-Cipó ou em
“Carrasco”. A parte de Mata de
Cipó ou a de carrasco é vegetação decídua ou parcialmente decídua. A principal
formação está no “Poço Escuro”, próximo
da crista da serra, nascente do rio
Verruga até parte do vale. Aí está a vegetação de maior porte da serra.
Há alguns
minadouros na serra, dentre os quais o
“Poço Escuro” (nascente do rio Verruga), o “Bebedouro da Toca da Onça”, o “Olho d ‘Água do Benedito”, etc. Estes minadouros resultam
do rastejamento lento do solo de cima para baixo ( ( “creep”, ou cripe), que abriu partes na serra, escavando-a (4).
A serra do
Piripiri historicamente é porta de entrada para o local onde foi edificada a
cidade de Vitória da Conquista. Por aí entraram os invasores da terra
Mongoyó. Vieram do rio das Contas ao rio
Gavião e deste para o riacho do Gado Bravo, até a encosta da serra e daí até o
vale do riacho da Vitória (rio Verruga, rio do Poço Escuro).
Na encosta
norte/noroeste, teria ocorrido a Guerra
de 1753 e o sítio ficou conhecido com o nome de Batalha, depois fazenda Batalha
- um latifúndio apossado por João Gonçalves da Costa
e, depois, de propriedade de seus descendentes. Em 1857 já estava fracionado.
O latifúndio
Batalha, no encosta norte/noroeste e em seu sopé, englobava diversas glebas,
dentre as quais o Piripirizinho, e teve importância: Terra de alguma água (na
encosta nasce o Bebedouro da Toca da Onça, por exemplo), e de controle da parte
inicial do caminho para Minas do Rio das Contas. Foi latifúndio pecuário e
policultor de subsistência.
A serra do
Piripiri geralmente é tida como toda a faixa que está acima de 1.000 metros de
altitude ( o ponto mais alto fica em 1.095 metros ou bem
pouco mais). Porque não se considera a serra como espaço a partir de 900 metros de altitude?
- É que a serra situa-se num planalto e só se destaca a partir de 1.000 metros , além de
que sua encosta, sobretudo aquela voltada para a cidade, é muito suave, porisso
longa. O quarto degrau de acesso à Igreja Matriz, na Praça Tancredo Neves, está em altitude de 927 metros . Descamba a
serra do Piripiri de uma altitude de até 1.095 metros (ou um
pouquinho mais) suavemente e é em sua falda que foi edificada a cidade de
Vitória da Conquista, antes Imperial Vila da Vitória, Distrito da Vitória,
Arraial de N.S. da Vitórial, Arraial da Conquista.
Embora em
muitas cidades os ricos prefiram a serra, aqui os ricos preferiram morar na
falda. A serra tornou-se morada de pobres.
A serra do
Piripiri foi (e ainda é) fonte de materiais com que a cidade foi construída. Aí
há jazidas de pedra, areia fina e de areia grossa. “Areia da Serra” é nome bem conhecido entre
pedreiros, seus ajudantes e construtores de casas. Aí, a partir de certo
momento, homens começaram a fazer
“brita” e vendê-la em porções medidas a latas de 20 litros . Não é errado
dizer que quase toda casa conquistense guarda um pedaço da serra do Piripiri.
A serra
forneceu égua com que, durante muito tempo, os moradores subsistiram: Aí nasce o
“Verruga”, no “Poço Escuro”, ou o
que os habitantes do centro da cidade chamavam
“O rego”.
A serra
fornecia lenha e gravetos (fonte de
energia) e ainda os fornece, embora em menor quantidade. A serra foi local de
lazer: piquiniques, caçada de passarinhos ou de calangos.
A serra
participava (de certa forma ainda o faz)
da cultura do Natal: Para a composição
(“armação”) do presépio, a serra do Piripiri fornecia a areia, os “lodos”,
o Gravatá, a “Cabeça de
Frade”, Palitos-de Doutor...
A serra
fornecia à criançada (sobretudo a esta)
seus frutos: Garapiá, Olho de Boi, Araça-mirim, Murta, Azedinha, Azeitona
Silvestre, Cambuí, Guabirabinha...
A serra foi
ponto de romaria: Bem cedo alí foi alçado um
“cruzeiro” de madeira
(substituído nos anos 60 por um cruzeiro de cimento, um pouco abaixo do
anterior).
O arraial de
João Gonçalves
da Costa cresceu e virou cidade, encompridando-se pelas margens tortuosas do
Verruga e pelas beiradas dos caminhos. A serra não seria exceção. Bem cedo a
serra fora ferida por estradas, ou caminhos. A estrada do Choça, um dos
caminhos mais antigos (seria verdade que aí ficava a “pedra do conselho” dos
Mongoyós?), a estrada do Gavião ( ou para o Gavião), os caminhos de São Berna rdo e da Preguiça, e, em 1926, a estrada de rodagem
de Conquista a Jequié (início na rua da Corrente -, “corrente onde era pago o pedágio), estrada
das boiadas...
Na beira da
estrada para Jequié e na estrada para o Choça surgiram pouquíssimas casas. Mas,
depois, perpendiculares às estradas Conquista a Jequié e das boiadas surgiram
parcelamentos: Na década de 50, o
“Loteamento Universitário” (Giovani Binelli e Iris Silveira), depois o
Alto São João ( José Viana
de Jesus e Maria Vitória de Jesus), Nossa Senhora da Vitória (Antonio Santos
Ferraz) a ampliação do Alto Maron, o Bairro Bonfim (Edgar Celino) etc. O terço
superior da encosta começou a ser ocupado e o limite do leito da antiga estrada
para Jequié ( rua da Corrente) foi ultrapassado. Manoel dos Santos (Manoel do
Rádio) e outros apossara m-se de
áreas e começaram a vender parcelas de posse. A partir da década de 70
ampliam-se parcelamentos irregulares a noroeste (Bairro N.S. Aparecida), com
parcelas vendidas por Jovino Santos,
Meneval Custódio, José Soares (Zé Guarda), Valdívio Ferreira, José de Souza Neto, etc. seguindo a estrada da
Batalha, e com arruamentos
perpendiculares a esta, processo que tem continuidade. Em área da
antiga “Lisboa”, houve parcelamento na década de 80, ampliando
o bairro Ibirapuera em direção à serra ( Loteamento Bruno Bacelar) etc, etc.
A ocupação
do solo para moradia ocorreu inicialmente de forma lenta e individual. As
ocupações multitudinárias e rápidas ocorrem a partir da década de 80 ( “Bruno
Bacelar”, “Cidade Nova”) e tentativas de novas ocupações multidinárias
ocorreram em 1997 e em 1998., impedidas de concretizarem.
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O homem aos
poucos vai tomando consciência da serra do Piripiri: Do seu embricamento com a
comunidade. A serra foi incorporada ao processo de luta pela sobrevivência do
homem-história. A espacialidade urbana conquistense não pode ser entendida sem
a serra. Há historicidade nisso tudo.
A primeira
consciência, é aquela do problema, a
partir de uma visão puramente centro-urbana.
De toda a
utilização/depredação da serra surgiu a serra-problema: É que, desbastada de
maior parte de sua vegetação, ferida pela exploração de areias e pedras,
ocupada por casas - a serra do Piripiri passou a representar/apresentar
problemas. As águas pluviais passam a descer violentamente da serra para a
cidade, carreando materiais para o centro: pedra, areias, “entulhos”
lá despejados, e dejetos humanos de casas não servidas por esgotos ou
fossas sanitárias vão para o centro da malha urbana. À medida que ocorrem
impermeabilização de sua encosta superior e o desmatamento, as águas descem
mais violentamente. Ora, a serra era vista como um problema para o centro: -
consciência superficial, incompleta.
Logo
estabeleceu-se uma contradição econômico-social complexa na relação da serra
com a “cidade”. A serra, que fornece terrenos baratos ( ou sem custo) para
muitos, trabalho a outros, gravetos a outros mais, exploração, água a muitos,
ajudando-os economicamente, torna-se custosa para o município. A cada chuva,
tratores, patróis, caçambas, veículos outros são deslocados e postos em
funcionamento e homens são arregimentados para removerem do centro da cidade o
material despejado pela serra, repor asfalto e calçamento retirados pela força
da água, desentupir galerias assoreadas. É como se pedaços da serra desabassem.
Em partes da serra, valas são feitas para direcionar águas pluviais. Tudo isso
tem um custo. “Duas economias” entram em
choque na relação da serra com a cidade, da serra-cidade com o centro. Remover
homens? Tirar “economias”? Continuar gastando com efeitos sem debelar causas?
como conciliar conflitos no espaço, pelo espaço, contra o espaço?
A política
pública centrada na consciência superficial e incompleta foi contraditória:
Decretou a serra como área de proteção ambiental ( J. Pedral, 1994) mas aí
locou uma “fábrica” de asfalto e daí
retira cascalho para suas obras. Desapropriou partes da serra, mas permitiu (
por omissão) depredração em áreas desapropriadas.
É difícil a
decisão da política pública sobre a serra. Porisso e por falta de uma consciência
( além das contradições, é claro) soluções são adiadas. Prefere-se muitas vezes
gastar muito e sempre a gastar para solucionar o problema, resolvendo a questão
daqueles que vivem da serra ( não falo dos exploradores sociais) ou na serra.
Há uma relação contraditória serra-centro.
A serra
problema despertou a consciência ecológica, antes da consciência de sua
historicidade, isto é, do saber acerca do envolvimento de homens e natureza na
serra na luta pela sobrevivência e de consequentes resultantes sociais disso. A
consciência ecológica sobre a serra, que esta vê a partir desta, demorou a
propagar-se ( década de 60, embora já nas décadas de 30/40 houvesse preocupação
em proteger “O Poço Escuro”). Mas a consciência ecológica sobre a serra
ainda falta resolver uma série de questões. Ainda há superficialidade que os
ecologistas locais saberão superar ( inclusive um olhar que não seja
apenas “sobre a serra”).
O
despertamento da consciência ecológica como ponto de partida para a resolução
do problema da serra do Piripiri foi ( e é importantíssimo) e ocorreu (ocorre)
no momento em que a serra já está articulada urbanisticamente à cidade, o que
significa dizer que o problema da consciência ecológica é o de pensar a serra
no contexto da cidade e, ainda mais, da região ( a serra é divisor natural de
águas que se destinam aos rios Pardo - caso do Verruga, por exemplo - e ao rio
das Contas, caso do riacho de Gado Bravo, através do rio Gavião: - De um lado
as águas buscam o rio das Contas, doutro lado demandam o rio Pardo. A divisão é
completada pelas serras do Taquaral e Landim, dentre outras).
O desafio da
consciência ecológica de fazer da serra depredada a “serra do Piripiri”- isto
é, de repor certa harmonia, importa em reocupá-la de forma diferente, inclusive
reocupá-la com vegetação. Mas isso não pode significar uma visão da serra
apenas a partir desta.
A idéia do
“Parque da Serra do Piripiri”, que
embrionariamente era pensada por várias pessoas ( sem projeto, com nomes e
concepções diferenciados), sistematizada grandemente pelo denôdo de Avaldo
Soares Filho, biólogo e ecologista, e
por seus assessores é passo importante, em tese. Mas há que definir o seu caráter ( detalhamento e concepção geral,
posicionamento no contexto da cidade, articulações, etc).
Assim é que
é necessário saber como ficarão homens (falo daqueles que são realmente pobres)
que vivem na serra ou/e da serra. É
necessário detalhar a forma de articulação ambiental com a cidade ( já que
existe uma articulação atualmente anti-ecológica, mas que é articulação). Não é
só a serra, ou a serra-cidade, que tem impacto sobre o centro, mas o centro tem
impacto sobre a serra. Foram sobretudo intervenções a partir do centro que
depredraram a serra. Algumas daquelas intervenções a partir do centro urbano (
ou que consideram os efeitos a partir do centro) demonstram como este exerce
impacto sobre a serra (valas para direcionamento de águas, por exemplo). A
economia é outro indicador ( muita lenha foi retirada da serra para esquentar
os fornos de padarias do centro, por exemplo). Como resolver um novo caráter de
articulação?
Um dos
problemas que devem ser resolvidos é o da circulação. Como já foi dito a serra
foi ferida por caminhos, estradas e, depois, ruas. Agora, definida a APA (Área de Proteção Ambiental), com o
projeto “Parque da Serra do Piripiri,
que já recebeu e receberá recursos do IBAMA, grassa a disputa sobre a locação
do “anel viário”, primeira etapa. É como
se duas propostas de ambientação estivessem em disputa ( porém é mais que isso
por seu significado). Deve ou pode o “anel viário” passar sobre área da serra
do Piripiri?’É urgente retirar da Avenida Presidente Dutra a tráfego pesado e
intenso que tem custado vidas humanas? Descaracteriza o projeto APA - “Parque
da Serra do Piripiri”- o trecho do anel viário passar sobre encosta superior da
serra quase quatro mil metros?
As perguntas
importam em abertura da discussão para um grupo mais amplo de pessoas, como
terminou por ocorrer a partir da intervenção do IBAMA em 12 de agosto próximo
passado, embora de forma não organizada. Mas a chave inicial da abertura das
discussões está no próprio caráter do Projeto Parque da Serra do Piripiri. Um
projeto preservacionista com atividades é diferente de um projeto
preservacionista “inativo”, isto é, de um projeto em que a natureza é
deixada para si mesma. Um projeto
preservaciocionista com atividade numa área fortemente articulada com o centro
urbano ( e já parte da malha urbana) é diferente de um projeto preservacionista
de uma área com frouxa articulação com a cidade. Um projeto de preservação com
atividade, próximo de um centro urbano e com este fortemente articulado (até
arterialmente) deve levar em consideração os problemas desse centro. Um projeto
preservacionista com atividade deve levar em conta interesses da população que
circula e de toda a população próxima.
Também ainda
precisam ser definidos: Utilização dos caminhos e estradas na serra ( como
ficarão a ligação Cruzeiro BR 116 e a
estrada da Batalha, dentre outras?); como compatibilizar o “Parque” com grandes ou pequenos equipamentos existentes
no local - Hotel, Motel, Edifício e torres da Telebahia, estação abaixadora de
energia elétrica, estações de rádio, etc? Como estes pagariam ônus de “viver” na serra bem melhorada?
A tentativa
de criação de um sistema harmonioso ( acreditem ou não na possibilidade de
harmonia com tantos interesses divergentes) da relação serra do
Piripiri/Centro, começa por gerar desarmonias ( tal é o conjunto de frutos da
contradição que perpassa a sociedade).
A definição
do tipo de compatibilização do uso do solo serra-centro urbano/ serra-cidade/
serra-núcleo urbano e do caráter da APA ( Área de Proteção Ambiental) deve
levar em conta fatores historicamente construídos.
Há pessoas
que vivem na serra ou da serra. Com a crise atual, a britação de pedras
aumentou. Como resolver o problema daqueles que fazem britas?
Há, como foi
dito, equipamentos de porte na serra do Piripiri, que importam em permanente
tráfego por esta: Hotel, Motel, estação abaixadora de energia elétrica, prédios
de empresas de rádio-difusão, etc. Como combinar o acesso a tais equipamentos
com o uso do “Parque”? Como fica a rede
de alta tensão elétrica que passa pela Serra? - E a “praça”
do Cristo?
Como ficarão
as “lavadeiras” que usam o “Poço Escuro”?
Como ficará a articulação da cidade com
“Lagoa das Flores” e “Choça”?
A remoção da
rodovia para o contorno importará em continuar direcionando águas pluviais para
a margem Oeste do atual leito daquela? Que significará para a serra a
transformação de toda a faixa “urbana”
da BR116 em avenida?
Como se vê
de simples perguntas, uma área de preservação ecológica em que houve e há
grande degradação e em que há substanciais áreas já construídas deve ter um
caráter que permita uma articulação urbana diferenciada. Não se trata de uma
área isolada ou pouco articulada com a malha urbana, seus habitantes e sua
economia. Haverá sempre áreas mais reservadas, mas sempre ocorrerá área de
penetração (deve-se diminuir esta ao máximo) que exigirá disciplina e fiscalização
adequadas e diferenciadas.
Tudo isso
deverá ser pensado globalmente já com profunda intuição de diretrizes urbanas
gerais (plano diretor urbano, ou que outro nome tenha).
A razão
ecológica, que fica fortemente evidenciada, nas divergências sobre a locação do
anel viário ( corte de cerca de 4.000 metros na serra) é importantíssima: Qualquer estrada perto de
núcleo urbano é vetor de crescimento deste. Estabelecida a estrada, as pressões
de “economia imobiliária” sobre o poder público são imensas no sentido de
modificar ou rever política de uso do solo. No caso da serra do Piripiri, não é
a estrada em si ( aquela já é varada por estradas, como a própria BR 116), mas
as consequências disso, inclusive valorização de terrenos com consequente
dificuldade financeira para desapropriação futura. Mas não se esquece que
animais geralmente são vítimas, o que implica em adotar-se sistema de proteção.
É bom frisar
que a consciência ecológica mobilizou pessoas ( e mobiliza-as) e tem sido a
detonadora de projeto mais completo até hoje apresentado para proteção da
serra. Do ponto de vista político isso tem relevância.
Também são
importantes argumentos daqueles que pensam a circulação e a necessidade de
imediata retirada do tráfego rodoviário do traçado urbano da BR 116 ( Avenida
Presidente Dutra) - que também tem sido luta de ambientalistas ( Valter Rocha, André Cairo, por exemplo).
A avenida
Presidente Dutra ( BR 116 no perímetro urbano) é hoje o mais grave exemplo de
confusão entre tráfego urbano e tráfego rodoviário. É uma estrada de rodagem
que se tornou avenida, sem deixar de ser o que era. O crescimento urbano a
oeste da rodovia tornou nociva sua permanência onde ora está; o corte da cidade
pelo meio tem sido fonte permanente de engarrafamentos, acidentes, estresse,
poluição, exigência de maiores gastos públicos, e sobretudo dificuldade de
gestão de espaço: sempre há choque entre o DNER, que administra a rodovia na
dimensão rodoviária e o município, que administra a avenida, na dimensão
urbana. Há limitação evidente do poder de administrar a cidade. Mesmo coisas
pequenas - um buraco ou a limpeza de valas - são objeto de disputa de
competência entre duas esferas de poder, ou de justificativa de omissão. Quem
conserta - prefeitura ou DNER?
É necessário
transformar imediatamente a faixa urbana da BR 116 em avenida ( bem articulada
com a serra), por muitos motivos de
melhor ambiência urbana e, inclusive, drástica diminuição do tráfego
pesado sobre uma das áreas mais críticas da serra do Piripiri.
Tem-se que
combinar duas necessidades: a remoção da rodovia da malha urbana e a
preservação da serra. Mas a preservação desta guardará marcas irreversíveis de
fatores construídos historicamente, que importam em dar-lhe caráter
diferenciado de outras APAS e é esse o desafio: Encontrar o “caráter” que não negue objetivos propostos
para o “Parque da Serra do
Piripiri”, mas entender que a APA (Área de Proteção Ambiental) deve ser
diferenciada de outros modelos existentes por força de transformações
historicamente ocorridas na serra. A complexidade de que hoje se reveste a
relação da serra com a malha urbana indica que o fundamental é a
compatibilização do traçado do anel, mesmo que sobre pequeno trecho da serra,
com a proteção desta em sua múltipla articulação com a cidade. Nada vem
isolado.
A serra,
ainda quase não estudada, desafia nossa consciência: - precisamos conhecê-la.
Notas
(1) “A semântica histórica passou a
aplicar o termo metonímia num sentido diacrônico, para indicar a mudança de
significação que resulta do emprego sistemático de uma palavra em metonímia, de
tal sorte que pouco a pouco se perde a relação entre esse emprego e a
significação específica, resultando daí a mudança do campo semântico para a
palavra”( J. Matoso Câmara - “Dicionário de Linguística e Gramática, Vozes,
1981). Embora possa dizer-se que o emprego do todo pela parte, e do conteúdo
pelo continente sejam exemplos de sinédoque, não se deve esquecer que a
metonímia compreende a sinédoque.
(2) Alfredo José Domingues e Elza Coelho Souza
Keller - “Bahia, Guia de excursão nº 6” , CNG, 1958.
(3) “Monadnock. Elevação residual que
resiste mais à erosão em áreas peneplanizadas” (Céurio de Oliveira - “Dicionário Cartográfico”, IBGE, 1983).
(4) “Creep” ou Rastejamento. Movimento
coletivo lento de solo de rocha decomposta (....) - Antonio Teixeira Guerra -
“Dicionário Geológico
- Geomorfológico”, IBGE, 1987.
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