Políticos
Ruy
Medeiros (Digitado, 04/1999)
A política é inevitável.
Uma teia envolvente, que diz respeito às relações de poder, perpassa a
sociedade e se traduz em organização, direito, ideologia, etc.
Produto de certo tipo de
economia, a política termina por potenciá-la e melhor organizá-la diante de
necessidades estratégicas. Inevitável e abrangente, a política enquanto
atividade contamina a todos, mesmo àquele a quem Brecht chamou de analfabeto
político.
Há mil e tantas formas
de fazer política. O fazer política nunca é neutro. Sempre pressupõe escolhas.
Mas pode ser ético ou não.
Na vida política
burguesa há um tipo de político que costuma ganhar espaço e que, por alguns
interesses bem localizados, os meios de comunicação privilegiam, considerando-os
“combativos” ou “polêmicos”. Certas qualidades negativas são lidas
positivamente. E essa leitura positiva da negatividade, exaustivamente
trabalhada, termina por arrebanhar votos e eleitores e passa por ser o
principal mecanismo de reprodução do poder pessoa daquele político. Sua
“pessoalidade” é carregada de ideologia, mas esta pretende esconder-se sob
diversos títulos, inclusive o título de defesa do bem coletivo, por manipulação
(interesses de um grupo, ou da classe dominante são traduzidos como “bem
comum”).
Esse tipo de político
burguês transforma a arena de combate político em um campo de batalha pessoal.
Para ficar em evidência, lhe é importante travar a luta política como uma luta
contra uma pessoa determinada. E quanto mais rancor colocar em sua atuação,
melhor acredita que desempenha o seu mandato. Pouco lhe importam os grandes
problemas: Tudo é submetido a seu interesse pessoal. Veste este interesse com
outras motivações. É como se, inimigo do bodegueiro da esquina, passasse a
acusá-lo da inflação, da dívida externa, da exploração generalizada. Medíocre,
a sua ascensão política depende do “rancor oportuno” e este, na vida política
burguesa funciona: Não se conhece um discurso brilhante, uma exposição de
ideário sério, uma análise, um pronunciamento profundo sobre uma questão
fundamental por parte desse tipo de político, mas ele sobrevive, repete-se, e
para exercitar seu extremo personalismo, muda de barco rancorosamente,
estrepitosamente, com ruídos, sob mil justificativas que não a verdadeira: o
rancor pessoal como estratégia ideológica na luta pelo poder, ou pela
conservação deste.
Esse político coloca
interesses pessoais sobre os interesses sociais, porém tem o cuidado de: a)
desqualificar as propostas do adversário; b) vestir de roupagem supostamente
moral o seu combate. Se algum grupo, na sociedade, é importante para sua
perpetuação no mandato, ou no cargo, aquele grupo passa a encarnar o interesse
social. Com que facilidade o “interesse do povo” passa a ser igual ao
“interesse de um grupo econômico”, ou de um segmento da economia. A arte da
inversão é um campo vasto.
Esse político não tem um
programa. Sua atuação pessoal prende-se na ideologia e no fazer político
próprios da burguesia. A sua incoerência - quando vistas as suas mutações de
partidos e de palanques - é escondida por um traço de sua maneira de agir: a
polêmica e a combatividade. Ou seja, sob o manto de seu combate rancoroso e sob
a capa de seus xingamentos (lidos como polêmica), esse político esconde sua
incoerência, seu profundo oportunismo.
Certas questões como
lealdade ou solidariedade não apresentam valor para esse político. Salta do
banco do correligionário, ou porque este está afundando, ou porque não foi
contemplado em qualquer pleito eminentemente pessoal. E será sempre fácil
justificar com suposta moralidade ou com suposto descumprimento de compromissos
maiores. O importante aí é mascarar a motivação pessoal. Por oportunismo,
alia-se transitoriamente entre fileiras antes adversárias e se aí ficar
confortável ou encontrar espaço para seus rancores e interesses, muda com armas
e bagagem. Aí, então, reinterpreta fatos, repudia ex-partidários, nega
participação em atos, etc., etc.
Esse tipo de político,
como se vê, por oportunismo extremo, por vingança, por despeito ou rancor, não
tem limites: Se for preciso fica honesto. “Honesto” por simples velhacaria.
Naquele momento ele lucra mais sendo honesto. Fica mais em evidência. Defende
um valor. Apaga possíveis manchas, ou assim pensa fazê-lo.
Este é o momento de gloria
desse tipo de político: Sua oportunidade de ser honesto. Repete-se, honesto por
velhacaria. Então requer comissões de inquérito, pede punição, persegue os
“desonestos”, torna-se arauto da moralidade e se diz defensor supremo dos
humildes e ofendidos. Enfim, um honesto defensor dos interesses públicos.
Aquele “bom” combate lhe é agora conveniente. Mas não é ética esta honestidade
por velhacaria.
Qualquer semelhança não
é mera coincidência.
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