quarta-feira, 23 de maio de 2012


CONDEÚBA, 150 ANOS - HISTÓRIA



Ruy Medeiros

 CONDEÚBA, COMEÇO DO RETRATO


 Onde está
 No sertão, mais precisamente na Microrregião Homogênea da Serra Geral da Bahia, vive a mais que centenária Condeúba. Sua região está ligada à capital do Estado, ao Nordeste e ao Sudeste do Brasil pelas rodovias BA 262 e 116. A cidade mantém intercâmbio comercial com Guanambi. Vitória da Conquista. Caetité com Municípios do Nordeste de Minas Gerais.

Seu nome, sua origem
 A cidade ainda não teve seu nome satisfatoriamente decifrado: Arvore dos caracóis, ou de frutos retorcidos (conda+yba), para Teodoro Sampaio, Fruta do Conde, no entender de Caldas Tibiriçá, Pau de Candeia, como pensa Mário Torres. A dificuldade aumenta com o fato de que os vocabulários disponíveis de Tupi antigo e de Nenhengatu não dão pistas seguras.
 A origem de Condeúba encontra-se no processo de ocupação do sertão que medeia entre Minas Novas e Araçuaí, Rio Pardo e Rio de Contas, intensificando-se a medida que a busca de metais e pedra preciosas e o relacionamento de Minas Novas e Minas do Rio de Contas se estabeleceu, quer por interesse do governo colonial, quer por iniciativa de particulares.
 Do processo de ocupação daquele período derivaram algumas aglomerações humanas, depois cidades, inclusive a atual Condeúba. O município teve seu foco de irradiação a partir do sítio Condeúba, latifúndio deitado às margens do Rio Gavião. Em 1745, foi erguida, em derredor da qual se estendeu o casario primitivo.
 Exatamente o fato de ficar a caminho da penetração de Minas Gerais para a Bahia, inclusive para o litoral, servindo de porta de adentramento à região de Rio de contas e ao São Francisco, fez o povoado prosperar. Situada na faixa intermediária de duas áreas de mineração, o núcleo de ocupação primitiva de Condeúba adotou a opção comum a tal tipo de zona: a pecuária e a agricultura de subsistência. As fazendas maiores adotaram a organização comum as zonas sertanejas: tendiam a produzir tudo o que era necessário para suprir modestas carências das famílias proprietárias. Não muito longe, passava o caminho que demandava do "Registro" (Minas Gerais) para o Valo e daí para Vereda (hoje Município de Vitória da conquista) donde seguia para o litoral. 
 Era um dos caminhos de viajantes, boiadas e mineradores. Outro também não muito distante, demandava do São Francisco, passava pelo Gavião e atingia o planalto.  Depois veio a estrada real que ligava São Felix às margens do Paraguassu, a Minas, tocando o termo de Condeúba, ou melhor, de Santo Antônio da Barra - como depois seria conhecida. Além de possuir suas próprias fazendas, Condeúba oferecia repouso à boiadas extenuadas que vinham de mais distantes. A articulação econômica, nos primórdios da localidade de Condeúba ia mais distante e o fato de ter o povoado pertencido à comarca de Jacobina e, depois, à comarca de Rio de Contas demonstra bem seu relacionamento com regiões auríferas. A articulação com Minas Gerais que pendurou bastante, era evidente. Não se tratava de local de simples trânsito, mas de uma economia que se integrava num conjunto maior: a pecuária, que estendia sua ocupação pelas margens do Rio Gavião e do Rio Pardo, este rio importante, cujo curso não está tão longe, considerando a extensão das terras sertanejas e de suas fazendas. Aliás, é exatamente isso que se explica o fato de Santo Antônio da Barra ter ficado de 1831 a 1839 sob jurisdição de Minas Gerais.         
 A fixação da pecuária permite o desenvolvimento populacional. Já em 1839, os habitantes reivindicaram ficar pertencendo à jurisdição da Bahia por contarem de 8 a 10 mil habitantes. Em 1872 o Censo Geral encontrara 21.023 habitantes, dos quais 19.469 analfabetos. Em 1892 o Censo apontou população de 28.291 mil pessoas.
 Durval Ferreira de Aguiar, que escreve em 1888, oferece uma descrição da Vila (pois o povoado fora erigido à categoria de Vila), que merece ser lembrada: "o povoado tem bonita perspectiva, com umas 500 casas de telhas, baixas, asseadas e de boa construção, muitas delas com janelas envidraçadas, assim como decente matriz e excelente palacete assobradado para casa da câmara, tendo no pavimento térreo uma segura cadeia e cômodas necessários a um pequeno destacamento. No centro da praça principal, acha-se um barracão para o mercado da feira que faz-se abundantemente aos sábados... o comercio é pequeno, porém relativamente muito suprido e animado, não só pelo movimento da feira, como pelo mercado que ali fazem de animais e vacum e cavalar tanto crioulo como exportado de São Paulo e Minas: regulando em mais de três mil cabeças só o gado que o município expende para esta capital, não obstante a distancia e as más estradas e em 500:000:000 anuais as transações comerciais do termo. Funcionavam na vila duas escolas, sendo uma de meninos com 41 matriculas e 30 de frequência e a de meninas com 30 matriculas e de 20 de frequência. No arraial de Candeal, também havia outra com 30 e tantos meninos. Com tão poucas escola e tais freqüências fica explicada a ignorância que geralmente se encontra na classe pobre."  
A feira era não só um acontecimento marcante econômico, mas também um acontecimento social: local de encontro de conhecidos, amigos e parentes que moravam em locais arretirados; oportunidade de saber notícias e novidades, meio de civilizar-se, ainda que acanhado. E tratava-se de uma feira grande, como se viu, e que ainda hoje tem continuidade e importância.

O "transito histórico"
 De simples população aglomerados em torno de uma capela, em 1745, oriunda de atividades econômicas voltadas para a pecuária e cultura de substância, cujo tempo exato de chegada deve ter ocorrido a partir de 1720, o Município cresceu. Já em 1839, a população era estimada entre 8 a 10 mil habitantes, conforme requerimento dos principais da terra, no qual solicitam que o povoado fique dependente da Bahia.
 Em 1860, o núcleo urbano foi elevado a categoria de Vila - "Vila de Santo Antônio da Barra", instalada no ano seguinte. Sua posição privilegiada, apesar da decadência da mineração no norte de Minas e em Rio de Contas, permitiu-lhe sobreviver, sobrevivência difícil como qualquer cidade sertaneja, marcadas pelas divergências políticas entre famílias principais. Mas não só as atividades de natureza econômica dificultavam a vida da cidade. Em sua história, contam-se episódios que marcaram a memória de seus habitantes por muito tempo. Assim, a seca, as moléstias, a enchente, a chegada da Coluna, ou dos "Revoltosos", são alguns dos fatos com que a cidade e o município conviveram.
 Na década de 70 do século XIX, a cidade foi flagelada por seca. Nem bem os efeitos desta haviam desaparecido, já em 1878, o município foi acometido por epidemia de varíola, que vitimou 66 pessoas na cidade e, possivelmente maior número na zona rural. Em 1872, foi a vez de a coqueluche ceifar grande número de vidas, em 1892 desinteira e sarampo toleraram a vida de 150 pessoas na cidade, número percentualmente elevado para a população na época. Em 1899, o município foi novamente varrido pela seca dramática, conhecida popularmente e guardada na memória como a "Noventinha", cujo nome é pronunciado pelo sertanejo velho ao mesmo tempo em que benze. O município não teve condição de abrigar centena de flagelados que vinham de Minas Geria em busca de melhores condições e que, daí, seguiram em rota trôpega para Conquista e outras regiões. Se a seca deixou rasto de vergonha, fome e prejuízo, o mesmo se pode dizer da enchente do Rio Gavião, em 1914. Casas foram destruídas na cidade e no campo, culturas foram desfeitas: a cidade foi parcialmente inundada e incontáveis danos ocorreram. A enchente, aliás, marcou o desenvolvimento futuro da cidade, pois os seus moradores passaram a escolher locais mais altos e mais distantes das margens do Gavião para edificarem suas vivendas.


 Os "Revoltos", ou a "Coluna Prestes". 
 Mas entre os fatos que marcaram a vida da cidade de Condeúba (o título da cidade veio coma República) um ficou na memória de todos, repetido de pais para filhos. Trata-se da ocupação de Condeúba pela Coluna Prestes, que as populações sertanejas denominavam apenas de "Os Revoltosos". A história mesmo popularmente, durante muito tempo, se dividia entre antes e depois dos revoltosos. Precedidas por notícias aterrorizantes e mentiras que apavoravam, os soldados da coluna aproximaram-se da cidade. Notícias vindas por telegrafo davam conta de sua aproximação e os habitantes da cidade a abandonaram. O fato ocorreu em 15 de abril de 1926.
Lourenço Moreira Lima, o "Bacharel Feroz", cronista acreditado a Coluna Prestes, depõe:
 "A população fugira toda... Prendemos um caixeiro viajante que se escondera no mato. Pouco depois chegou um seu irmão dono de uma tipografia, na qual imprimimos um boletim. Condeúba foi a melhor cidade que ocupamos nos sertões baianos. É rica e grande, tendo várias ruas calçadas e uma boa edificação particular. Possui um belo prédio destinado a Intendência Municipal. Soltamos os presos que encontramos na cadeia, como fizemos em Minas do Rio de Contas e todos os lugares por onde passamos. Ali demoramos até a manhã do dia 17."


 Modernização e problemas
 Do ponto de vista urbano, a cidade sofreu alterações de interesses na década de 20 do século passado. Razão teve o cronista da Coluna Prestes quando assinalou positivamente seu aspecto de cidade grande para o Sertão da Bahia da época. A população do Município, quase toda concentrada na zona rural, em 1920 já era de 60.297 habitantes. O paço municipal foi modificado, ganhando nova fachada e platibanda. Novas casas foram construídas em estilos mais "modernos", embora preservando aspectos de um colonial simplificado, como ainda hoje vemos. Prédio escolar foi edificado.
 Notam-se, no decorrer de sua história momentos acentuados e relativo desenvolvimento, alguns com intensidade relativamente profunda. Assim é que na primeira década do século o momento foi de recessão, o mesmo ocorrendo da década de 30 e na década de 60. Períodos de crescimento ocorreram na primeira metade da década de 40 (em razão das necessidades da guerra), e na década de 70, quando ocorreram aportes de financiamentos bancários para o município.
 A partir da década de 70, a cidade começa a perder algumas de suas características. Inclusive ocupação, por construções, da principal praça, que teve sua área sensivelmente reduzida com a edificação de bancos, casas comerciais e do mercado coberto.
 A cidade, o Município, como todo o Brasil, passa por crise econômica atualmente (lembre-se que esse texto foi redigido em 1991 e naturalmente conta a situação da época). As diferenças sociais são acentuadas, assim como as diferenças de oportunidades. A população pobre do campo migra temporariamente, quer para zona cafeeira polarizada por Vitória da Conquista, quer para região aglomerada do Vale do Iuiu. Há, igualmente, fluxo migratório para outras cidades próximas e para São Paulo, de forma permanente ou não.
 O censo de 1980 apontou índice de apenas 39% de sua população alfabetizada.
 A atividade agropecuária responde por mais de 75% dos empregos e ocupações oferecidas.  Mais de 90% da população, pelo referido censo, aufere rendimentos inferiores a 2 salários mínimos.
 A terra está concentrada em poucas mãos e o processo de concentração tem continuidade e é agravado pelo fato de a pecuária absorver pouca mão-de-obra. Dados disponíveis indicam a seguinte realidade fundiária:
 88% das fazendas têm área inferior a 100 hectares, mas em seu conjunto ocupam apenas 51,6% da área rural do Município. Enquanto isso, 11.9% das fazendas têm área acima de 100 hectares, mas em seu conjunto dominam 48,4% de toda área rural do município. Isso significa que menos fazendas ocupam proporcionalmente área bem maior. A situação já é de si mesma injusta, mas a justiça é potenciada por outros fatos: no biênio 1986/1987, 85% dos proprietários de fazendas maiores (de 50 a 100 hectares ou mais) receberam créditos agrícolas, enquanto que somente 9% dos pequenos proprietários (1 a 10 hectares) receberam aqueles créditos (91% dos pequenos proprietários foram excluídos, portanto dos créditos agrícolas). Os atravessadores compram a preços baixos a produção dos pequenos agricultores que, às vezes, são obrigados a venderem seus produtos abaixo do preço mínimo de garantia e mesmo abaixo do preço da semente. A pobreza é visível, especialmente na zona rural do Município.
 A vida política não está alheia a influencia das grandes famílias do Município e, ainda recentemente, a influencia das famílias Torres e Cordeiros, na disputa da hegemonia municipal, se faz presente.
 Ruy Medeiros
1991

 NOTA DO AUTOR: Este texto, como já foi descrito antes, foi redigido em 1991 (vinte anos atrás), portanto as informações contidas no mesmo estão desatualizadas. Condeúba, naturalmente, após esse tempo sofreu mudanças significativas e existem muitas coisas a serem descritas ainda. Atualmente a cidade completou 150 anos de emancipação política e esses relatos são para aquelas pessoas que desconhecem sobre a história de Condeúba. Alguns artigos foram copiados da internet, este, portanto, foi digitado por mim e tem como responsável o historiador Ruy Medeiros (a quem eu parabenizo pelo valioso e singelo relato). Tudo está exatamente como o autor escreveu.
 Para saber mais sobre Condeúba, leia:
 CARVALHO, Nestor Evangelista. "Breve Notícia sobre o Município de Condeúba".
TORRES, Dr. Tranquilino Leovegildo. "Memória Descritiva do Município de Condeúba". 2ª ed. Condeúba, Typographia Vieira, 1924.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - "Enciclopédia dos Municípios Brasileiros". Volume XX, Bahia A - L verbete Condeúba, Rio de Janeiro, 1958.
SOUZA, Agnério Evangelista de - "Condeúba - sua História, seu Povo", dactiloescrito inédito, Condeúba, 1983.


NOTA
RETRATO DE CONDEÚBA
De 23 a 30/11/91
 Este texto foi redigido em pouco tempo,
Afim de compor a exposição promovida
Por Carlos Eduardo de Souza Ferreira e
Hildebrando Oliveira, intitulado "Retrato
de Condeúba", a realizar-se entre os dias
23 e 30 de novembro de 1991, em home-
nagem ao povo de Condeúba, no 130° ano
da "instalação" da "Vila de Santo Antônio
da Barra", hoje cidade de Condeúba.





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