quarta-feira, 30 de maio de 2012


VITÓRIA DA CONQUISTA

Breves Notas da Evolução Econômica
- Os produtos e o Comércio

Ruy Medeiros (Digitado. 11/2004)




INTRODUÇÃO


A pedido deste Jornal, que dedica uma edição ao Dia da Cidade (09 de novembro), é feita uma breve notícia da evolução da economia local. Não se trata de um estudo amplo, pois esse não é o objetivo do autor, nem do jornal. Incentivo correlato para escrevê-lo é o fato de freqüentemente o autor ser procurado para conceder entrevista sobre o tema. Houve opção por incluir algumas informações que, para muitos, não teriam qualquer importância, mas que o autor crê ter sido relevante para as pessoas envolvidas com atividades às quais ditas informações referem-se. E, além disso, são dados que muitos desconhecem e que ajudam a compor um quadro.

Trata-se, é evidente, de uma síntese que, mesmo com esse caráter, é bem incompleta, envolvendo sobretudo a pecuária, gêneros e o comércio.



1. O Gado

Desde o planejamento da ocupação do território do Sertão da Ressaca, o gado esteve presente. Para autoridades e coloniais, tratava-se de invadir a grande área do Planalto e aí estabelecer fazendas de criação de gado bovino, de início nas faixas da caatinga e, depois, na Mata de Cipó. E, realmente, isso ocorreu, avançando para a Mata.

Um fato, nos últimos anos do Século XVIII, deu impulso à atividade pecuária: A extração de madeira, para a indústria naval portuguesa, nas matas de Valença, Camamu e adjacências. Aí mesmo, algumas pequenas embarcações eram feitas, mas a madeira local era sobretudo retirada para ser enviada à metrópole. Com essa aitividade madeireira, o ouvidor de Ilhéus incentivou João Gonçalves da Costa a conduzir gado para aquela região litorânea e, depois, a abrir estrada para o litoral. O fato terminou por auxiliar o incipiente desenvolvimento do Sertão da Ressaca, dentro do qual havia surgido minguado casario de onde se originou o Arraial da Conquista, depois Povoado da Vitória e, posteriormente Imperial Vila da Vitória, Conquista, e Vitória da Conquista. A partir de 1910, o gado adquire maior importância, que crescerá com a introdução do Zebu, a partir de 1909, porém com desenvolvimento maior a partir de 1915 com plantel de vários zebuínos introduzido por Teopompo de Almeida. Em 1930, o rebanho já contava com 114.220 bovinos e 12.749 equinos. Em 1946, incentivados pela demanda do período da Guerra, os fazendeiros aumentaram o criatório: o rebanho passou para 250.000 bovinos, 28.000 equinos, 6.000 asininos, 8.000 muares, 7.000 suínos, 18.500 ovinos e 30.000 equinos. Nesse ano foram produzidos 859.376 quilos de carne no valor total de CR$ 5.261.499,00.

2. O Algodão

A par da pecuária, surge a exploração do algodão já em inícios do Século XIX, especialmente na Fazenda Barra da Vereda, de Antonio Ferreira Campos. O algodão era colhido e, sem qualquer beneficiamento, era ensacado em bruacas de couro e transportado para Salvador, o grande mercado de então. Em 1957, foi inaugurada em Anagé, estabelecimento para beneficiamento de algodão, a Sociedade Algodoeira Gavião, empresa de propriedade de Gelásio Alves dos Santos, Roduzindo Alves dos Santos (que detinham importância política na região), Helvécio Amorim e Hercílio Lima. A empresa funcionou por pouco tempo. Até os anos 60 do século passado, a região produziu algodão. Nessa década, o empresário Ademar Galvão estimulou o seu plantio, criou uma beneficiadora com capacidade de fiar e tecer que não suportou a crise e faliu: era a Usina Ouro Branco, estabelecida em 1963. Seu ativo, e a esmagadora parte dos bens de Ademar Galvão e Irmãos
(donos de várias empresas) responderam por débitos, judicialmente.

3. Subsistência

As fazendas, no entanto, não eram apenas de pecuária ou de algodão. Muitas vezes produziam as duas coisas e sempre produziam gêneros de subsistência, ou mantimentos, na linguagem local: Mandioca, aipim, batata, feijão, milho, andu. Nas várzeas seria plantado arroz posteriormente. As fazendas, em verdade, eram núcleos da sociedade e só se pode entender a economia e a sociedade locais a partir desse núcleos. Aí se produzia tudo o que era necessário e se comprava o mínimo de outras regiões. Já na eras das Repúblicas Velha e Nova (fase Getulista) se costumava dizer que de fora só se compravam o sal e o querozene. Às vezes, nem o sal. Em alguns lugares, extraia-se o sal da terra. No entanto, geralmente o sal vinha de Salinas das Margaridas.

Ao lado dos mantimentos, surgiram frutas, como banana e abacaxi (principais). A produção agrícola, em 1946, foi de CR$ 4.224.191,00, já apresentando relevo no contexto do Planalto da Conquista.

4. Drogas do Sertão

Simultaneamente ao surgimento das fazendas e durante a existência dessas, alguns “produtos” eram extraídos para venda para o litoral. Raízes, cascas, sementes de vegetais, muito usados na Medicina de então. Os olhos de hoje geralmente mantêm um presentismo nocivo à compreensão da história. Pessoas viviam de extrair partes de vegetais para vendê-las (e ainda hoje o fazem), atividade importante no conjunto de uma economia fraca, quando vista em quadro territorial mais amplo. Não é demais lembrar que grande parte da fortuna de Rotodano foi realizada com revenda de Óleo de Pau (Óleo de Copaíba) e que, ainda na década de 1950, a Ipecacuanha (Ipeca) era extraída em quantidades na região de Encruzilhada.

5. Borracha

Embora a borracha tenha sido produto que, na Bahia, era extraída nas Regiões da Serra Geral e no Oeste, nas bordas (patamares) do Oeste e no noroeste do Sertão da Ressaca, em finais do Século XIX e na década inicial do Século XX, se extraia igualmente a borracha, quer da Mniçoba (arbusto da mesma família da Mandioca), quer da Mangabeira. A borracha da Bahia chegou a figurar com certa importância na pauta de exportações de nosso Estado. Não longe do Planalto da Conquista, na Fazenda Lafaiate, em Minas Gerais, havia grandes prensas de rolos do látex endurecido, já “afogueado”. A borracha da Bahia é pouco estudada, embora tenha tido importância, inclusive no período da Segunda Guerra Mundial (depois houve tentativa – final dos anos 60 primeira metade dos anos 70 do Século passado de reerguer, no Oeste, a extração da Borracha de Mangabeira, depois abandonada). Hoje há plantações de Hevea Brasiliensis no litoral sul do Estado para produção de Borracha.

6. Madeira

O planalto ocupa vasta área e a sua diversidade florística é patente: Mata (na Encosta do Planalto), Mata-de-Cipó, Mata de Larga, Caatinga, Carrasco... A atividade de exploração de madeira na região, para venda local e a outras regiões, ocorreu especialemente a partir dos anos 30 do Século XX, tendo sido intensificada nos anos 40 e 50 do mesmo Século, embora grande parte das matas tenha sido, em verdade, destruída, pelo fogo, para formação de pastagem. Qualquer história da economia regional não pode deixar de levar em consideração essa atividade que, para alguns proprietários, foi a única atividade. Ipê, Peroba, Gonçalo Alves, Vinhático, Pau Brasil, Jequitibá, Pau d’ arco, Putumuju, Itapicuru, Jacarandá, foram extraídos em grande quantidade. No conjunto da economia dos períodos assinalados, a atividade madeireira teve real importância, não apenas regional.

7. Mamona

A mamona teve relevo econômico e social. Plantada na parte da caatinga, era atividade sem maior exigência técnica, que absorvia a família de pequenos proprietários. Servia para custear despesas das famílias que se dedicavam à economia de subsistência (“mantimentos”). No século XX, especialmente na sua segunda metade até os anos 70, houve seu plantio em área relativamente grande. O plantio de forma mais científica e planejada na Índia e na China fizeram com que a Mamona brasileira não fosse competitiva e isso teve impacto sobre a pequena economia familiar da caatinga. Hoje, há movimento pela retomada de seu plantio. Uma empresa – A Pelcoman, de Aurino Gonçalves, Alicio Gonçalves e irmãos destacou-se como grande compradora de mamona, e de peles de cabras e de bovinos da região.

8. Pó – de – palha (cera do Ouricuri)

Assinale-se, na década de 40 do século XIX, a existência do Pó-de-palha, ou cera da folha do Ouricuri. A grande demanda de cera vegetal, especialmente para a fabricação de discos e outros obtejos, não foi satisfeita unicamente pela cera de Carnaúba do Ceará, do Piauí, etc. A cera do Ouricuri substituía a cera de carnaúba e/ou a complementava (embora inferior em qualidade) diante da grande demanda. Empresa sita em Salvador, dirigida por Franklin Lins de Albuquerque, comprava o Pó-de-palha a fim de exportá-lo meio-beneficiado. Os camponeses da caatinga passaram a extrair a cera do ouricuri, ensacá-la e a vendê-la a prepostos daquela empresa ou a atravessadores. Normas legais foram editadas para evitar que todas as folhas de cada árvore fossem cortadas (permitia-se apenas o corte de parte das palmas) e para considerar o rude processo de sua extração de domínio público (apesar de a cera ser retirada da folha com um processo rudimentar – pressiona-se ponta da folha numa coxa com dedo polegar esquerdo, enquanto os dedos da mão direito pressionavam uma faca que deslizava longitudinalmente pela folha também pressionada contra a lâmina, retirando-lhe a cera), pois um particular pretendeu patentear em seu nome o processo! Tal produto servia para complementar a pobre receita de famílias camponesas cujos membros reuniam-se no terreiro ou debaixo de um alpendre para acumular a cera que lhe rendia alguma coisa. Teve importância complementar da economia familiar sertaneja. Hoje, quando pesquisadores procuram investigar a vida camponesa ouvem dos velhos a menção ao pó-de-palha que outra coisa não era senão a cera do ouricuri.

9. Café

Embora o café estivesse presente em várias partes do Planalto da Conquista, ele tinha importância comercial em Poções e na Encosta do Planalto (Iguaí, sobretudo). Na década de 60 do Século XX, a Governo Federal determinou a erradicação dos cafezais e, realmente, eles foram erradicados nas regiões referidas, pagando-se, por intermédio do Banco do Brasil, aos proprietários que os erradicaram, por área antes plantada. No entanto, no início da década de 70 do mesmo Século XX, diante da ferrugem e das geadas, que atingiram cafezais em São Paulo e no Paraná, e da política de produção de grãos para incrementar as exportações brasileiras, surgiu o PRRC – Plano de Recuperação e Revigoramento da Lavoura Cafeeira. O café passou a ser plantado em diversos municípios do Planalto da Conquista, inclusive em Vitória da Conquista, com incentivos governamentais. Tratava-se agora de uma cultura moderna e que teve grande impacto no crescimento do comércio local de cidades e de vilas. Tudo veio acompanhado de modificação na estrutura fundiária da região.

10. Comércio

O comércio foi primeiramente feito pelos tropeiros, que levavam mercadorias, produtos, do Planalto da Conquista para outras regiões e que para o Planalto traziam produtos de diversas áreas. Os tropeiros – donos de tropas – abasteciam feiras e armazéns. Alguns apenas eram transportadores, outros eram comerciantes propriamente ditos. À medida que a Vila se desenvolvia, o movimento dos tropeiros se estabelecia. Houve, primeiramente, trajetos para Rio de Contas, Valença, Camamú e Ilhéus. A partir da segunda metade do Século XIX, o trajeto para Ilhéus tornou-se importante e alguns pousos intermediários se consolidaram: Ferradas (em Ihéus, depois Itabuna) e Cachimbo (hoje Capinarama, no município de Ribeirão do Largo, onde o trajeto se bifurcava para Condeúba e Minas Geras). É certo que, com a implantação de fazendas de cacau em Ilhéus e Tabocas (Itabuna), o movimento entre o Planalto da Conquista e aquelas localidades aumentou (do Planalto da Conquista saiam carne seca, farinha, requeijão e outros produtos para abastecer aquelas áreas que, entre 1890 e 1915 tiveram crescimento populacional surpreendente e se tornaram bem dinâmicos graças ao cacau). O cacau, assim, influenciou o desenvolvimento agrícola e comercial de Vitória da Conquista. Mas não só Ilhéus atraia o movimento dos tropeiros, pois outro trajeto gradativamente passou a ser importante: o de Nazaré, que se estabelecera lentamente.

Quando da implantação de vias férreas, os tropeiros passaram a complementar aquilo que os vagões dos trens-de-ferro faziam. Assim, encurtando caminho, iam buscar ou embarcar mercadorias em Machado Portela (estação criada em 1883, no Município de Maracás, hoje sua área está dentro do Município de Marcionílio Souza) e também em Jequié, onde havia outra estação ferroviária, a partir de 1927. No final do Século XIX, chegou e ser licitado trecho de ferrovia de Ilhéus a Vitória da Conquista, mas apenas um pequeno trecho, dentro de Ilhéus, foi implantado.

Gradativamente, graças à localização (“meio caminho” entre litoral e Alto Sertão) e à produção pecuária e agrícola, o comércio foi-se desenvolvendo. Embora não estivesse à altura do Comércio de Condeúba, a partir dos anos 30 passou a ter a mesma importância desse para, logo depois superá-lo. Desde o início do século XX já possuía importantes armazéns e, na década de 20, a primeira agência interiorana do Banco Econômico. Na década de 40, o município já com seus 33.554 habitantes (8.644 na zona urbana) será beneficiado com o cruzamento de duas grandes rodovias: A Ilhéus Lapa (que o ligava a Ilhéus e ao Alto Sertão) e a Rio-Bahia (que o ligava ao Sudeste e a Salvador). As estradas potencializam o crescimento comercial em curso (para o qual muito contribuiu a Segunda Guerra Mundial), em grande parte e, doutra parte, o induzem.

Vitória da Conquista na década de 60 do Século XX, já será uma cidade-polo, exercendo atração sobre mais de 50 municípios. Tornara-se um grande entreposto, considerando-se a escala de desenvolvimento urbano da Bahia no tempo. Continua a ser uma das cidades com maior área de influência, porém já sofrendo a concorrência de Montes Claros (Minas Gerais) e Barreiras (Oeste da Bahia). Seu comércio terminou por ser um dos mais diversificados do Nordeste do Brasil.

11. Indústria

A indústria nunca teve grande desenvolvimento. No Século XX, a partir da década de 20 pequenas unidades de fabricação de móveis e de alimentos surgem. Algumas serralherias, voltadas para a construção civil aparecem, na década de 40. Pequenas unidades de trabalho com couro (selas, arreios, sapatos), objetos cerâmicos ou de cimento, fabrico de sabões, com pouca diferença disso, compõem o quadro industrial até os anos 60 do Século findo. No entanto, considerando a realidade do interior baiano, essa indústria acanhada tem importância regional. Em 1970 é projetado o Centro Industrial dos Imborés, ainda com sua infraestrutura incompleta. De qualquer maneira, pequenas e caseiras fábricas de alimentos, estabelecimentos que trabalham em função de construção civil (mármores, granitos, etc), a unidades de produtos metalúrgicos e, presentemente, fábricas de calçados ampliam o espaço de indústria local. Vale notar que o Distrito Industrial dos Imborés, ou Centro Industrial, começa a sua estrutura (abertura de ruas, calçamento, etc) no momento em que tem início a desaceleração da economia brasileira (“crise do milagre”), época não propícia para atração de capitais de outras regiões e época de crise local, durante a qual recursos próprios e subsídios foram direcionados para a cafeicultura.

Merece estudo maior, que portanto não cabe nesse espaço disponível, a evolução econômica regional, inclusive com análise do setor de serviço, que ultimamente tem-se desenvolvido (serviços médicos e de educação sobretudo).

Fica aqui essa breve exposição, com o desejo de que um dia possa ser ampliada.


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