VITÓRIA DA CONQUISTA
Breves Notas da Evolução Econômica
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Os produtos e o Comércio
Ruy Medeiros (Digitado. 11/2004)
INTRODUÇÃO
A pedido deste Jornal, que dedica uma edição ao Dia
da Cidade (09 de novembro), é feita uma breve notícia da evolução da economia
local. Não se trata de um estudo amplo, pois esse não é o objetivo do autor,
nem do jornal. Incentivo correlato para escrevê-lo é o fato de freqüentemente o
autor ser procurado para conceder entrevista sobre o tema. Houve opção por
incluir algumas informações que, para muitos, não teriam qualquer importância,
mas que o autor crê ter sido relevante para as pessoas envolvidas com
atividades às quais ditas informações referem-se. E, além disso, são dados que
muitos desconhecem e que ajudam a compor um quadro.
Trata-se, é evidente, de uma síntese que, mesmo com
esse caráter, é bem incompleta, envolvendo sobretudo a pecuária, gêneros e o
comércio.
1. O Gado
Desde o planejamento da ocupação do território do
Sertão da Ressaca, o gado esteve presente. Para autoridades e coloniais,
tratava-se de invadir a grande
área do Planalto e aí estabelecer fazendas de criação de gado bovino, de início
nas faixas da caatinga e, depois, na Mata de Cipó. E, realmente, isso ocorreu,
avançando para a Mata.
Um fato, nos últimos anos do Século XVIII, deu
impulso à atividade pecuária: A extração de madeira, para a indústria naval
portuguesa, nas matas de Valença, Camamu e adjacências. Aí mesmo, algumas
pequenas embarcações eram feitas, mas a madeira local era sobretudo retirada
para ser enviada à metrópole. Com essa aitividade madeireira, o ouvidor de
Ilhéus incentivou João
Gonçalves da Costa a conduzir gado para aquela região
litorânea e, depois, a abrir estrada para o litoral. O fato terminou por
auxiliar o incipiente desenvolvimento do Sertão da Ressaca, dentro do qual
havia surgido minguado casario de onde se originou o Arraial da Conquista,
depois Povoado da Vitória e, posteriormente Imperial Vila da Vitória,
Conquista, e Vitória da Conquista. A partir de 1910, o gado adquire maior importância,
que crescerá com a introdução do Zebu, a partir de 1909, porém com
desenvolvimento maior a partir de 1915 com plantel de vários zebuínos
introduzido por Teopompo de Almeida. Em 1930, o rebanho já contava com 114.220
bovinos e 12.749 equinos. Em 1946, incentivados pela demanda do período da
Guerra, os fazendeiros aumentaram o criatório: o rebanho passou para 250.000
bovinos, 28.000 equinos, 6.000 asininos, 8.000 muares, 7.000 suínos, 18.500
ovinos e 30.000 equinos. Nesse ano foram produzidos 859.376 quilos de carne no
valor total de CR$ 5.261.499,00.
2. O Algodão
A par da pecuária, surge a exploração do algodão já
em inícios do Século XIX, especialmente na Fazenda Barra da Vereda, de Antonio
Ferreira Campos. O algodão era colhido e, sem qualquer beneficiamento, era
ensacado em bruacas de couro e transportado para Salvador, o grande mercado de
então. Em 1957, foi inaugurada em Anagé, estabelecimento para beneficiamento de
algodão, a Sociedade Algodoeira Gavião, empresa de propriedade de Gelásio Alves
dos Santos, Roduzindo Alves dos Santos (que detinham importância política na
região), Helvécio Amorim e Hercílio Lima. A empresa funcionou por pouco tempo.
Até os anos 60 do século passado, a região produziu algodão. Nessa década, o
empresário Ademar Galvão estimulou o seu plantio, criou uma beneficiadora com
capacidade de fiar e tecer que não suportou a crise e faliu: era a Usina Ouro
Branco, estabelecida em 1963. Seu ativo, e a esmagadora parte dos bens de
Ademar Galvão e Irmãos
(donos de várias empresas) responderam por débitos, judicialmente.
(donos de várias empresas) responderam por débitos, judicialmente.
3. Subsistência
As fazendas, no entanto, não eram apenas de pecuária
ou de algodão. Muitas vezes produziam as duas coisas e sempre produziam gêneros
de subsistência, ou mantimentos, na linguagem local: Mandioca, aipim, batata,
feijão, milho, andu. Nas várzeas seria plantado arroz posteriormente. As
fazendas, em verdade, eram núcleos da sociedade e só se pode entender a
economia e a sociedade locais a partir desse núcleos. Aí se produzia tudo o que
era necessário e se comprava o mínimo de outras regiões. Já na eras das
Repúblicas Velha e Nova (fase Getulista) se costumava dizer que de fora só se
compravam o sal e o querozene. Às vezes, nem o sal. Em alguns lugares,
extraia-se o sal da terra. No entanto, geralmente o sal vinha de Salinas das
Margaridas.
Ao lado dos mantimentos, surgiram frutas, como
banana e abacaxi (principais). A produção agrícola, em 1946, foi de CR$
4.224.191,00, já apresentando relevo no contexto do Planalto da Conquista.
4. Drogas do Sertão
Simultaneamente ao surgimento das fazendas e durante
a existência dessas, alguns “produtos” eram extraídos para venda para o
litoral. Raízes, cascas, sementes de vegetais, muito usados na Medicina de
então. Os olhos de hoje geralmente mantêm um presentismo nocivo à compreensão
da história. Pessoas viviam de extrair partes de vegetais para vendê-las (e
ainda hoje o fazem), atividade importante no conjunto de uma economia fraca,
quando vista em quadro territorial mais amplo. Não é demais lembrar que grande
parte da fortuna de Rotodano foi realizada com revenda de Óleo de Pau (Óleo de
Copaíba) e que, ainda na década de 1950, a Ipecacuanha (Ipeca) era extraída em
quantidades na região de Encruzilhada.
5. Borracha
Embora a borracha tenha sido produto que, na Bahia,
era extraída nas Regiões da Serra Geral e no Oeste, nas bordas (patamares) do
Oeste e no noroeste do Sertão da Ressaca, em finais do Século XIX e na década
inicial do Século XX, se extraia igualmente a borracha, quer da Mniçoba
(arbusto da mesma família da Mandioca), quer da Mangabeira. A borracha da Bahia
chegou a figurar com certa importância na pauta de exportações de nosso Estado.
Não longe do Planalto da Conquista, na Fazenda Lafaiate, em Minas Gerais , havia
grandes prensas de rolos do látex endurecido, já “afogueado”. A borracha da
Bahia é pouco estudada, embora tenha tido importância, inclusive no período da
Segunda Guerra Mundial (depois houve tentativa – final dos anos 60 primeira
metade dos anos 70 do Século passado de reerguer, no Oeste, a extração da
Borracha de Mangabeira, depois abandonada). Hoje há plantações de Hevea
Brasiliensis no litoral sul do Estado para produção de Borracha.
6. Madeira
O planalto ocupa vasta área e a sua diversidade
florística é patente: Mata (na Encosta do Planalto), Mata-de-Cipó, Mata de
Larga, Caatinga, Carrasco... A atividade de exploração de madeira na região,
para venda local e a outras regiões, ocorreu especialemente a partir dos anos
30 do Século XX, tendo sido intensificada nos anos 40 e 50 do mesmo Século,
embora grande parte das matas tenha sido, em verdade, destruída, pelo fogo,
para formação de pastagem. Qualquer história da economia regional não pode
deixar de levar em consideração essa atividade que, para alguns proprietários,
foi a única atividade. Ipê, Peroba, Gonçalo Alves, Vinhático, Pau Brasil,
Jequitibá, Pau d’ arco, Putumuju, Itapicuru, Jacarandá, foram extraídos em
grande quantidade. No conjunto da economia dos períodos assinalados, a
atividade madeireira teve real importância, não apenas regional.
7. Mamona
A mamona teve relevo econômico e social. Plantada na
parte da caatinga, era atividade sem maior exigência técnica, que absorvia a
família de pequenos proprietários. Servia para custear despesas das famílias
que se dedicavam à economia de subsistência (“mantimentos”). No século XX,
especialmente na sua segunda metade até os anos 70, houve seu plantio em área
relativamente grande. O plantio de forma mais científica e planejada na Índia e
na China fizeram com que a Mamona brasileira não fosse competitiva e isso teve
impacto sobre a pequena economia familiar da caatinga. Hoje, há movimento pela
retomada de seu plantio. Uma empresa – A Pelcoman, de Aurino Gonçalves, Alicio
Gonçalves e irmãos destacou-se como grande compradora de mamona, e de peles de
cabras e de bovinos da região.
8. Pó – de – palha (cera do Ouricuri)
Assinale-se, na década de 40 do século XIX, a
existência do Pó-de-palha, ou cera da folha do Ouricuri. A grande demanda de cera
vegetal, especialmente para a fabricação de discos e outros obtejos, não foi
satisfeita unicamente pela cera de Carnaúba do Ceará, do Piauí, etc. A cera do
Ouricuri substituía a cera de carnaúba e/ou a complementava (embora inferior em
qualidade) diante da grande demanda. Empresa sita em Salvador, dirigida por
Franklin Lins de Albuquerque, comprava o Pó-de-palha a fim de exportá-lo
meio-beneficiado. Os camponeses da caatinga passara m
a extrair a cera do ouricuri, ensacá-la e a vendê-la a prepostos daquela
empresa ou a atravessadores. Normas legais foram editadas para evitar que todas
as folhas de cada árvore fossem cortadas (permitia-se apenas o corte de parte
das palmas) e para considerar o rude processo de sua extração de domínio
público (apesar de a cera ser retirada da folha com um processo rudimentar – pressiona-se
ponta da folha numa coxa com dedo polegar esquerdo, enquanto os dedos da mão
direito pressionavam uma faca que deslizava longitudinalmente pela folha também
pressionada contra a lâmina, retirando-lhe a cera), pois um particular
pretendeu patentear em seu nome o processo! Tal produto servia para
complementar a pobre receita de famílias camponesas cujos membros reuniam-se no
terreiro ou debaixo de um alpendre para acumular a cera que lhe rendia alguma
coisa. Teve importância complementar da economia familiar sertaneja. Hoje,
quando pesquisadores procuram investigar a vida camponesa ouvem dos velhos a
menção ao pó-de-palha que outra coisa não era senão a cera do ouricuri.
9. Café
Embora o café estivesse presente em várias partes do
Planalto da Conquista, ele tinha importância comercial em Poções e na Encosta
do Planalto (Iguaí, sobretudo). Na década de 60 do Século XX, a Governo Federal
determinou a erradicação dos cafezais e, realmente, eles foram erradicados nas
regiões referidas, pagando-se, por intermédio do Banco do Brasil, aos
proprietários que os erradicaram, por área antes plantada. No entanto, no
início da década de 70 do mesmo Século XX, diante da ferrugem e das geadas, que
atingiram cafezais em São
Paulo e no Paraná, e da política de produção de grãos para
incrementar as exportações brasileiras, surgiu o PRRC – Plano de Recuperação e
Revigoramento da Lavoura Cafeeira. O café passou a ser plantado em diversos
municípios do Planalto da Conquista, inclusive em Vitória da Conquista, com
incentivos governamentais. Tratava-se agora de uma cultura moderna e que teve
grande impacto no crescimento do comércio local de cidades e de vilas. Tudo
veio acompanhado de modificação na estrutura fundiária da região.
10. Comércio
O comércio foi primeiramente feito pelos tropeiros,
que levavam mercadorias, produtos, do Planalto da Conquista para outras regiões
e que para o Planalto traziam produtos de diversas áreas. Os tropeiros – donos
de tropas – abasteciam feiras e armazéns. Alguns apenas eram transportadores,
outros eram comerciantes propriamente ditos. À medida que a Vila se
desenvolvia, o movimento dos tropeiros se estabelecia. Houve, primeiramente,
trajetos para Rio de Contas, Valença, Camamú e Ilhéus. A partir da segunda
metade do Século XIX, o trajeto para Ilhéus tornou-se importante e alguns
pousos intermediários se consolidaram: Ferradas (em Ihéus, depois Itabuna) e
Cachimbo (hoje Capinarama, no município de Ribeirão do Largo, onde o trajeto se
bifurcava para Condeúba e Minas Geras). É certo que, com a implantação de
fazendas de cacau em Ilhéus e Tabocas (Itabuna), o movimento entre o Planalto
da Conquista e aquelas localidades aumentou (do Planalto da Conquista saiam
carne seca, farinha, requeijão e outros produtos para abastecer aquelas áreas
que, entre 1890 e 1915 tiveram crescimento populacional surpreendente e se
tornaram bem dinâmicos graças ao cacau). O cacau, assim, influenciou o
desenvolvimento agrícola e comercial de Vitória da Conquista. Mas não só Ilhéus
atraia o movimento dos tropeiros, pois outro trajeto gradativamente passou a
ser importante: o de Nazaré, que se estabelecera lentamente.
Quando da implantação de vias férreas, os tropeiros
passara m a complementar aquilo que
os vagões dos trens-de-ferro faziam. Assim, encurtando caminho, iam buscar ou
embarcar mercadorias em
Machado Portela (estação criada em 1883, no Município de
Maracás, hoje sua área está dentro do Município de Marcionílio Souza) e também
em Jequié, onde havia outra estação ferroviária, a partir de 1927. No final do
Século XIX, chegou e ser licitado trecho de ferrovia de Ilhéus a Vitória da
Conquista, mas apenas um pequeno trecho, dentro de Ilhéus, foi implantado.
Gradativamente, graças à localização (“meio caminho”
entre litoral e Alto Sertão) e à produção pecuária e agrícola, o comércio
foi-se desenvolvendo. Embora não estivesse à altura do Comércio de Condeúba, a
partir dos anos 30 passou a ter a mesma importância desse para, logo depois
superá-lo. Desde o início do século XX já possuía importantes armazéns e, na
década de 20, a
primeira agência interiorana do Banco Econômico. Na década de 40, o município
já com seus 33.554 habitantes (8.644 na zona urbana) será beneficiado com o
cruzamento de duas grandes rodovias: A Ilhéus Lapa (que o ligava a Ilhéus e ao
Alto Sertão) e a Rio-Bahia (que o ligava ao Sudeste e a Salvador). As estradas
potencializam o crescimento comercial em curso (para o qual muito contribuiu a
Segunda Guerra Mundial), em grande parte e, doutra parte, o induzem.
Vitória da Conquista na década de 60 do Século XX,
já será uma cidade-polo, exercendo atração sobre mais de 50 municípios.
Tornara-se um grande entreposto, considerando-se a escala de desenvolvimento
urbano da Bahia no tempo. Continua a ser uma das cidades com maior área de
influência, porém já sofrendo a concorrência de Montes Claros (Minas Gerais) e
Barreiras (Oeste da Bahia). Seu comércio terminou por ser um dos mais
diversificados do Nordeste do Brasil.
11. Indústria
A indústria nunca teve grande desenvolvimento. No
Século XX, a partir da década de 20 pequenas unidades de fabricação de móveis e
de alimentos surgem. Algumas serralherias, voltadas para a construção civil
aparecem, na década de 40. Pequenas unidades de trabalho com couro (selas,
arreios, sapatos), objetos cerâmicos ou de cimento, fabrico de sabões, com
pouca diferença disso, compõem o quadro industrial até os anos 60 do Século
findo. No entanto, considerando a realidade do interior baiano, essa indústria
acanhada tem importância regional. Em 1970 é projetado o Centro Industrial dos
Imborés, ainda com sua infraestrutura incompleta. De qualquer maneira, pequenas
e caseiras fábricas de alimentos, estabelecimentos que trabalham em função de
construção civil (mármores, granitos, etc), a unidades de produtos metalúrgicos
e, presentemente, fábricas de calçados ampliam o espaço de indústria local.
Vale notar que o Distrito Industrial dos Imborés, ou Centro Industrial, começa
a sua estrutura (abertura de ruas, calçamento, etc) no momento em que tem
início a desaceleração da economia brasileira (“crise do milagre”), época não
propícia para atração de capitais de outras regiões e época de crise local,
durante a qual recursos próprios e subsídios foram direcionados para a
cafeicultura.
Merece estudo maior, que portanto não cabe nesse
espaço disponível, a evolução econômica regional, inclusive com análise do
setor de serviço, que ultimamente tem-se desenvolvido (serviços médicos e de
educação sobretudo).
Fica aqui essa breve exposição, com o desejo de que
um dia possa ser ampliada.
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