quarta-feira, 30 de maio de 2012


VITÓRIA DA CONQUISTA NOS ANOS 1960-1978


Ruy Medeiros(Digitado, 08/2003)





1. As origens de Conquista e do seu povo

Vitória da Conquista é a capital regional do Centro-Sul da Bahia. Começou como pequeno núcleo no final do século XVIII; em 1840 emancipou-se da vila de Caetité e tornou-se vila: Imperial Vila da Vitória (na organização política do Império, “Vila” designava tanto o núcleo urbano sede do município, quanto o próprio município. As sedes de vilas mais importantes podiam adquirir a denominação de cidades). Após a proclamação da República (15 de novembro de 1889), a Imperial Vila da Vitória foi confirmada como município e sua sede recebeu o nome de Conquista, na categoria de cidade.

A ocupação do solo não ocorreu sem lutas. Os nativos que ocupavam o Sertão da Ressaca (Mongoiós, Imborés e Pataxós) reagiram à ocupação do solo pelos invasores, em conflitos armados que, em relação aos Pataxós, perdurou até o século XX. Foram lutas que terminaram por liquidar a população Mongoió e Imboré, em verdadeiro genocídio.

Durante todo o Século XIX o município cresceu lentamente. Na região criava-se gado (bovino, ovino, caprino), havia cultura de algodão e de subsistência (milho, mandioca, batatas, feijão, e, nas várzeas, arroz). Seus pastos asseguravam a alimentação de boiadas vindas do Sertão do São Francisco para o litoral. A economia era centrada em grandes propriedades pecuárias e policultoras, com a presença de escravos e alguns trabalhadores nas franjas dos latifúndios, que produziam gêneros de subsistência e garantiam mão de obra suplementar aos grandes proprietários.
O poder político local era concentrado nas mãos da família e parentela do fundador. O povo era extremamente pobre.

No início do Século XX, o município foi positivamente influenciado pelo dinamismo econômico da zona cacaueira, pois passou a ser fornecedor de produtos para essa. Sua economia cresceu.

Na primeira metade do século XX, o município foi cortado por duas grandes rodovias: a rodovia Ilhéus-Lapa, que o comunicou com o litoral (Ilhéus) e com o sertão do São Francisco (Lapa); a rodovia Rio-Bahia, que o ligou a Salvador, no litoral baiano, e ao Rio de Janeiro, no Sul do País. Com essas estradas, Conquista foi crescendo em importância. Nessa mesma época obteve o nome atual de Vitória da Conquista, a fim de não manter duplicidade com nome idêntico de outra cidade. Retomava-se, assim, o antigo nome da freguesia da época do Império.

Em 1950 o município tinha 33.550 habitantes, sendo 26.993 na zona rural e 19.463 na zona urbana. Porém, em 1960 a população total era de 80.113 habitantes dos quais 31.401 estavam na zona rual e 48.712 residiam na zona urbana. A política continuava dominada pelas famílias tradicionais, que disputavam o poder local de forma acirrada.

A década de 50 do Século XX, na cidade, esteve marcada por fortes embates políticos. As famílias tradicionais disputavam acirradamente o poder político. Um grupo delas cortejava a população crescente da cidade e criticava as oligarquias, com um discurso populista. A década seria marcada politicamente pelo confronto de duas facções, ambas com controles familiares, porém uma delas dotada de discurso próprio para obter apoio dos setores urbanos, incluindo aí população que migrara para o município a partir da década de 30, especialmente a partir dos anos 40 do século passado.

Em 1950 Edivanda tinha sete anos de idade, filha de um casal simples e trabalhador. O pai aos poucos conseguiu ser proprietário de uma pequena fazenda, região de Itapetinga, dedicando-se à atividade agropecuária.

As eleições de 1958 são fortemente polarizadas por duas candidaturas (embora houvesse mais de duas): A candidatura de Gerson Gusmão Sales, chefe de prestigiada família, e a candidatura de José Fernandes Pedral Sampaio, envolvendo arco de apoio partidário maior, porém que demonstrou menor densidade eleitoral. Em 1962, são ainda essas duas facções que irão se defrontar eleitoralmente. A facção liderada por José Fernandes Pedral Sampaio ampliara seu círculo de apoios: abrangia desde ex-integralistas, ou integralistas, até simpatizantes ou integrantes do PCB. Apresentava discurso reformista, nacionalista por parte de alguns de seus integrantes. Houve a preocupação de inserir jovens na campanha e os estudantes secundaristas, em sua maior parte, optaram pela candidatura de José Fernandes Pedral Sampaio, pondo-se contra o candidato Jesus Gomes dos Santos, apoiado pelo Sr. Gerson Gusmão Sales e Edvaldo Santos Flores (respectivamente prefeito e ex-prefeitos municipais). Sagrou-se vencedor o Sr. José Fernandes Pedral Sampaio (José Pedral).


2. Vitória da Conquista nos anos 1960-1964

A década de 1950 marcou o crescimento econômico de Vitória da Conquista. O Sul do país estava em plena fase de industrialização, atraindo grandes massas de nordestinos, fugindo da seca. Com o asfaltamento da Rio-Bahia, Vitória da Conquista tornou-se um centro rodoviário importante. Muitos, vindos do Nordeste ou da região interiorana, instalaram-se na cidade, dando vida a várias atividades no comércio e a pequenas empresas de condução familiar (fabrico de móveis, marcenaria, olaria, artefatos de couro e fabrico de esquadrias de metal).

Na época a região contava também com pecuária bovina e caprina; a agricultura era de subsistência, o comércio era a atividade mais importante. A cidade passou ser, desde final dos anos 40, uma central de distribuição em todo o sertão de mercadorias vindas de vários lugares, especialmente do sul do país.

A seca foi um problema na região de Conquista. A maior parte do município situa-se no semi-árido. As chuvas são irregulares e a precipitação pluviométrica é baixa. Periodicamente assolado pelas secas, a atividade econômica da cidade não apresentava condições de absorver o êxodo do campo para a cidade, nem aquele de outras regiões e não conseguia absorver igualmente os jovens no mercado de trabalho. O índice de desemprego era grande e a distribuição de rendas, perversa, como ainda o é. O latifúndio rural marcava forte presença, mas havia também pequenas propriedades agrícolas exploradas em regime familiar.

A cada período seco a cidade era invadida por mendigos, que deixavam o campo e pequenas cidades e vilas vizinhas, buscando sobrevivência na caridade ou na solidariedade pública. A cidade não parava de crescer numericamente.

Em 1958 houve eleições para prefeito, fortemente polarizadas por duas facções, que se defrontaram novamente nas eleições de 1962. A facção liderada por José Pedral Sampaio ampliou seu círculo de apoios: abrangia desde ex-integralistas, ou integralistas, até simpatizantes ou integrantes do PCB. Apresentava discurso reformista, nacionalista por parte de alguns de seus integrantes. Houve a preocupação de inserir jovens na campanha. Os estudantes secundaristas, em sua maior parte, optaram pela candidatura de José Fernandes Pedral Sampaio, que saiu vitorioso.

Os anos 1960-1964 foram bastante agitados em todo o país. A sede de reformas na sociedade brasileira era intensa e repercutia em todos os lugares do país. Os trabalhadores ampliaram o quadro de sindicalizados e patrocinavam greves; os camponeses, no Nordeste, organizavam suas ligas. Nas cidades ocorreu movimento de organização de moradores; partidos de esquerda pronunciavam-se; militares inquietavam-se nos quartéis.
A Igreja Católica desde a década de 1940 organizava operários. A partir de 1960 acentuou a atuação, também com a finalidade de disputar com comunistas e reformistas a preferência ideológico-organizativa de trabalhadores rurais e urbanos. Nas grandes cidades incentivou movimentos de ação católica. Surgiram assim a JOC (Juventude Operária Católica), a JEC (Juventude Estudantil Católica) e JUC (Juventude Universitária Católica). Estes movimentos católicos inspiravam-se na Ação Católica da França e da Bélgica. Da JUC irá nascer a Ação Popular, que cresceu entre estudantes e entre trabalhadores. Vários militantes da Ação Popular acabaram entrando em organizações de esquerda.

Toda esta movimentação sócio-política do país repercutia na região de Vitória da Conquista. No meio estudantil conquistense havia simpatias para a recém vitoriosa revolução cubana de 1959. Estudantes do Instituto de Educação Euclides Dantas organizaram, em 1961, paralizações e protesto contra a tentativa de impedir a posse do vice João Goulart, após a renúncia de Jânio Quadros. As reformas de base, especialmente a reforma agrária, eram objeto de discussões nos vários locais da cidade. A pregação de Brizola, de forte conteúdo nacionalista (especialmente sua “Denúncia à Nacionalidade”), tinha ressonância na cidade baiana. Foi organizada a Frente de Libertação Nacional de Vitória da Conquista. Os estudantes criavam seus grêmios e panfletos da UNE (União Nacional de Estudantes) apareceram no Instituto de Educação Euclides Dantas.

A Igreja Católica, a partir de 1961, implantou o MEB (Movimento Educação de Base) em todo o país. Em Conquista o MEB chegou em 1962, sob a responsabilidade e a orientação de Edivanda Maria Teixeira e Zildete Guimarães, professoras recém formadas.  

Educadoras natas, Edivanda e Zildete passaram a utilizar o método de alfabetização de Paulo Freire, atuando na região interiorana de Vitória da Conquista, junto às pessoas mais sofridas. Não durou muito tempo o trabalho do MEB. O método utilizado, que implicava em desvelar a realidade e conscientizar pessoas quanto à sua situação, era visto com desconfiança pelos conservadores. Não sobreviveu à profunda e criminosa intolerância do golpe fardado de 1964.

O golpe militar, em Vitória da Conquista, desencadeou repressão sobre aqueles que apregoavam as reformas de base, as idéias socialistas e nacionalistas. Em maio de 1964, muitas pessoas foram presas em Vitória da Conquista e várias passaram a responder a Inquérito Policial Militar (IPM), presidido pelo Major Bendochi Alves Filho, em clima de pavor público. O prefeito municipal, Sr. José Fernandes Pedral Sampaio, foi destituído do cargo (depois teria seus direitos suspensos por dez anos). Um vereador filiado ao MTR (Movimento Trabalhista Renovador), Péricles Gusmão Regis, morreu na cadeia, após prestar depoimento ao major Bendochi Alves Filho. Seu corpo apresentava vários cortes e contusões e circulou a versão de que fora assassinado, embora a versão oficial tivesse sido de suicídio.

O golpe militar dissolveu os velhos partidos e, como em outros lugares, também em Conquista apenas dois partidos foram permitidos: A ARENA (Aliança Renovadora Nacional) e o MDB  ( Movimento Democrático Brasileiro). Este último reunia forças de oposição, enquanto o primeiro agrupava diversos grupos de apoio ao regime de terror implantado em 1964, num amargo 1° de abril.

Apesar da força do MDB, as eleições municipais de 1965 foram vencidas pela ARENA, por causa das sublegendas. Esse partido governou o município até março de 1973, quando as eleições foram ganhas pelo MDB, da linha mais autêntica.

3. Atuação da Igreja Católica

A Igreja católica, já na década de 1950, vinha atuando na sociedade através da ação dos Vicentinos e dos Círculos operários católicos. Nos anos 1962-1964 marcou presença através do MEB, graças a atuação de Edivanda e Zildete.

Mas foi sobretudo com a chegada dos padres italianos que o engajamento da Igreja Católica cresceu. O trabalho deles era movido por uma forte motivação de fé cristã e de propagado amor ao povo, sobretudo aos pobres. Eu me limito a ver somente os efeitos do trabalho no campo social e político (no sentido mais profundo da palavra).

Logo em 1968 formaram-se grupos de jovens com forte interesse pelo social, e sobretudo, as comunidades (CEBs – comunidades eclesiais de base). O mérito dos padres italianos segundo seu próprio depoimento é que partiram do povo, dos pobres, sem se meter nas políticas partidárias. Confiaram no povo. Juntos com uma equipe eficiente de jovens militantes deram vida a várias atividades, entre as quais as escolas de alfabetização, com clara referência ao campo social e político. Edivanda estava de cheio neste trabalho.

Sem fazer barulho, sem ligação a forças políticas partidárias, começava em Vitória da Conquista o maior trabalho de conscientização e organização popular havido até agora. Um novo capítulo da história de Conquista estava sendo escrito, desta vez, diretamente pelo povo. Qualquer historiador honesto, ao escrever a história daquele período, não poderá desconhecer esta grande novidade, de acordo com a visão dos padres e leigos mais avançados politicamente. Não resta dúvida de que as CEBS tinham caráter popular e que buscavam uma atuação autônoma, apesar de influência institucional da Igreja.

As CEBs começaram nos bairros mais pobres da cidade (Rua da Corrente, Pedrinhas, Cruzeiro, Jurema e depois em outros) e, aos poucos, se espalharam pela zona rural. O trabalho das comunidades ajudava os participantes, e de conseqüência o povo em geral, a ter um conhecimento objetivo da realidade, no seu aspecto social, econômico e político.

Muitas iniciativas foram surgindo no campo da saúde e da educação. A grande novidade – e que se constituía também numa grande força - era o povo se sentindo sujeito da coisa. Não foi nada fácil no começo, pois o povo nunca fora tratado como sujeito, como cabeça pensante e atuante na sociedade; mas deu muito resultado, no sentido do engajamento em lutas comuns e de conhecimento da realidade.

Numerosas outras atividades foram surgindo, criando uma nova consciência política, como: lutas por abastecimento de água, por fornecimento de energia elétrica, por estradas, por escolas, calçamento de ruas, campanha para obtenção de filtros d’água domésticos; por construção de fossas sépticas, etc. As comunidades educavam e induziam à ação. Na época, falava-se em respeitar e valorizar tudo de bom que havia na cultura popular. As comunidades usavam o método de trabalho que era: ver, julgar e agir.
As comunidades cresceram. Seu centro difusor era o trabalho dos padres italianos da Paróquia Nossa Senhora das Graças (Luís Mosconi, Virgílio, Afonso, José, João Pedro). Um grupo significativo de homens e mulheres assumiram a caminhada, atuando nos vários campos da sociedade. As CEBs eram realmente uma sementeira de lideranças. Em primeiro lugar devemos citar o nome de Edivanda, mas houve muitos outros. Cito somente alguns nomes: Conceição Nascimento, Maria do Carmo, Railda Santos, Maria da Conceição, Lelinha, Doginha, Mariano, Dorivaldo, Dalva, Geraldo, as irmãs Ana Stela e Eci, Zé Pereira, Floriza, Lindaura, João da Corrente, João de Alvina, Maria de Jesus (da Estiva), Júlia Nunes (Lagoa de Timóteo), Ulisses (Barrocas), Ovídio (Pretinho), Noeci Salgado; e muitos, muitos outros.

Desafios novos surgiram no campo e na cidade. A urgência de formar animadores, lideranças era grande, para garantir a caminhada, termo com que os agentes envolvidos caracterizavam essa invenção do movimento popular e que tinha forte apelo. Por isso havia encontros, retiros, debates. Por causa disso surgiu o jornal das comunidades chamado O ANIMADOR e o programa radiofônico A Voz da Diocese. O jornal era preparado em equipe, mas quem o redigia era a incansável Edivanda.

4. A Implantação do pólo cafeeiro na região de Vitória da Conquista

 O censo de 1970 apontava Vitória da Conquista como a segunda cidade do interior da Bahia. Já eram 127.528 habitantes, dos quais 85.959 encontravam-se na cidade. No município e na região nova cultura chegou.
A implantação da Lavoura Cafeeira na região de Conquista foi decidida em 1972 e começou “para valer”.

A região não desconhecia a cultura do café. Municípios próximos, como Poções, Planalto, Iguaí e Nova Canãa eram produtores de café. Porém nos anos finais da década de 60 do século passado (XX), o Governo Federal promoveu a erradicação dos cafezais, indenizando aqueles que os destruíssem.

No entanto, já em inícios da década de 70, o Governo federal alterou planos quanto à cafeicultura na região do Planalto da Conquista: Passou a realizar mapeamento de áreas com altitudes iguais ou superiores a 700 metros e a verificar se seus solos eram adequados ao plantio de café, com mudas resistentes. Isso ocorreu principalmente porque o governo, premido por dificuldades, pretendia ampliar a exportação de grãos e porque nas tradicionais áreas produtoras (São Paulo e Paraná, principalmente) os cafezais passaram a sofrer mais os efeitos de geadas e da doença da ferrugem. Em conseqüência disso, áreas em Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia (Planalto da Conquista, Chapada Diamantina, superfície Jequié-Jaguaquara) foram consideradas adequadas ao plantio do café, especialmente dos tipos catuaí e mundo novo.

Teve a implantação da cultura cafeeira impacto forte, pois a nova cultura passou a exigir utilização de máquinas (tratores, roçadeiras), adubos químicos ao lado de adubos orgânicos, correção do solo, em razão da acidez, com a utilização de calcáreo, defensivos agrícolas, desmatamento de áreas com vegetação primária e desaparecimento local de algumas espécies, verificação de curvas de níveis, etc. Eram procedimentos que destoavam daqueles tradicionalmente utilizados.

No mundo do trabalho, especialmente no período em que os preços internacionais e internos do café foram vantajosos, as alterações foram granges. Trabalhadores, em fase de plantio e, principalmente, nos períodos de colheita, eram recrutados em quantidade, nas cidades da região, às vezes fora da região, nas vilas e nos povoados e mesmo entre pequenos proprietários da zona da caatinga (Anagé, Manuel Vitorino, Tremedal, Caraíbas, Cândido Sales, etc). O número de trabalhadores temporários (bóias frias) aumentou em prejuízo dos trabalhadores fixos, isto é, que trabalhavam em lides rurais, na época de colheita, e em trabalhos urbanos (construção civil, biscates) em outros momentos ou que, então, migravam para trabalho na zona cacaueira, na época da colheita, ou na época do corte de cana para Minas Gerais, ou para Mato Grosso e Goiás para trabalho nos arrozais. A desorganização da economia camponesa tradicional liberou grande contingente de trabalhadores e alterou o perfil de ocupação do solo e o perfil do trabalhador agrícola. O mundo do trabalho, na região sofreu transformação significativa, portanto. Muitos pequenos proprietários, posseiros, “agregados”, e/ou seus familiares deixam o cultivo direto da terra e vão para a periferia das cidades, vilas e povoados, em condições precárias de existência.

Essa situação era um novo desafio para as comunidades eclesiais de base, que passaram a buscar os novos assalariados e bóias frias com as dificuldades existentes, dentre os quais o medo dos trabalhadores fixos de perderem o emprego e a mobilidade dos bóias frias, que migravam periodicamente para outras regiões.

Grandes empréstimos foram subsidiados para os plantadores de café e as infraestruturas necessárias. De conseqüência, a agressão à economia camponesa familiar foi intensa. As terras valorizaram, pequenos proprietários foram induzidos a venderem suas glebas, algumas propriedades foram subdivididas, outras foram concentradas. Famílias de posseiros e de “agregados” foram desalojados de suas terras de trabalho. Enfim, houve grande desagregação e disputas pela terra.

Exemplo maior dessas disputas ocorreu na Fazenda Pau Brasil, distante poucas léguas de Vitória da Conquista, na qual 123 famílias, radicadas há muito na área, tiveram de lutar intensamente pela posse da terra. Surgiram bóias frias.

Uma nova realidade foi moldada pela implantação de lavoura cafeeira. Além de grande desagregação da produção familiar camponesa, de subsistência, o número de trabalhadores fixos nas fazendas passou a ser ínfimo em relação aos temporários (recrutados para plantio, limpa e colheita), muitos destes vindos de outros lugares, quando se tratava da colheita.

A própria cidade cresceu. O comércio passou a contemplar novas demandas e a expandir-se. A construção civil, até então em crise, retomou as atividades. Surgiram novos loteamentos. Mansões foram construídas. A periferia da cidade passou a contar com imenso número de pobres, residindo em precárias condições.

Dentro da nova realidade, os velhos sindicatos de trabalhadores rurais passaram a ter suas diretorias pelegas contestadas, o mesmo acorrendo com as diretorias de sindicatos urbanos.
As Comunidades Eclesiais de Base tiveram o desafio de ficar a altura da situação, enfrentando-a de frente, movidas sempre por um grande idealismo cristão. Passaram a organizar os trabalhadores rurais para a luta sindical de trabalhadores rurais de Vitória da Conquista (após 1978 surgiram oposições sindicais rurais em Cândido Sales, Encruzilhada, Barra do Choça, Anagé). A oposição comerciaria, surgida para a luta sindical dos trabalhadores urbanos, embora não tivesse surgido nas CEBs, contavam com comerciários cristãos do chamado “trabalho de jovens” (movimento de jovens).

5. Gratidão de Vitória da Conquista a Edivanda

Edivanda Maria Teixeira esteve completamente envolvida nesse trabalho com o povo desde 1968. Os padres davam todo o apoio, ajudavam a aprofundar, a ligar fé-vida, a articular forças, a pensar nas conseqüências. È relevante dizer que os trabalhos das CEBs eram realizados em equipe, as discussões e tomadas de decisões era feitas democraticamente. Tratava-se de um trabalho coletivo.

Por pouco tempo aquela combatente educadora popular aceitou a coordenação de Professores Municipais que lhe fora oferecida pela administração do Prefeito Raul Carlos de Andrade Ferraz (Raul Ferraz) de Vitória da Conquista. Não se adaptou ao serviço burocrático. Suas exigências de educadora popular eram diferentes daquelas da administração municipal. A militância no meio do povo era-lhe essencial.

Em 1978 o movimento pela liberdade e pela igualdade social perdeu uma de suas maiores combatentes e uma de suas grandes educadoras: Edivanda Maria Teixeira. Ela deixou um grande exemplo de dignidade, de amor, ética, combatividade e solidariedade.

A sociedade de Vitória da Conquista sente-se honrada pela vida e atuação de Edivanda Teixeira. Sua memória não pode ser esquecida.






* Ruy Medeiros é advogado, professor de direito na Universidade Estadual de Vitória da Conquista, assessor de movimentos sociais, membro da Comissão Justiça e Paz da arquidiocese de Conquista



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