Memória, Imagem,
Religião, Educação: herança de uma sociedade no limiar da (des)razão (texto
apresentado no Colóquio do Museu
Pedagógico
Profa. Dra. Ana Palmira B.S. Casimiro
apcasimiro@oi.com.br e
apcasimiro@bol.com.br
Prof. Ruy Hermann Araújo Medeiros
ruy-medeiros@uol.com.br
Grupo de Pesquisa: Fundamentos da Memória, Arte, Religião
e Educação do Museu Pedagógico da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia -
UESB
RESUMO
Este estudo faz parte da discussão e pesquisa
que vem sendo desenvolvida no Grupo de Estudos e Pesquisa Fundamentos da
Educação: Memória, Imagem, Religião e Educação do Museu Pedagógico da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Para correlacionarmos as categorias
a seguir mencionadas, elaboramos extenso trabalho de análise estilística,
formal e estética das imagens religiosas nos vários períodos históricos,
cotejando os conteúdos plásticos com os conteúdos verbais correspondentes, bem
como com informações pertinentes à educação, prevalentemente a educação
religiosa (nos colégios, nas missões e na catequese). Consideramos a
dificuldade de cruzar essas variáveis propostas e entender como elas funcionam
como uma herança de uma sociedade no limiar da (des)razão. Tentaremos pincelar
as principais fases críticas e/ou significativas de transformações dessas
variáveis, as quais coincidiram com mudanças mais radicais da sociedade.
Esperamos que, ao invés de parágrafos conclusivos, surjam novas questões a
serem estudadas e debatidas e para muitas ainda não temos respostas. Este é um
trabalho ainda em andamento e por este motivo ainda não dispomos de conclusões
finais. Ao mesmo tempo, tentarmos compreender por que esses títulos (conceitos)
tem tudo a ver com uma sociedade no limiar da (des/razão).
Palavras-chave:
Educação, Arte, Imagem, Igreja Católica,
Estado.
RESUMEN
El texto presentado es el resultado de la discusión
y la investigación que se ha desarrollado en los estudios y fundamentos de
investigación de la educación: memoria, imagen, religión y educación del Museo Pedagógico
de la Universidad Estadual do Sudoeste da Bahia. Para las siguientes
categorías, hemos desarrollado una amplia labor de análisis estilístico, formal
y estético de imágenes religiosas en los diferentes períodos históricos,
emparejando el posible contenido plástico más largo con el contenido verbal
correspondiente, así como información pertinente a la educación, principalmente
educación religiosa (en colegios, en las misiones y en catequesis).
Consideramos que la dificultad de cruzar estas propuestas de variables y
comprender cómo funcionan como un patrimonio de una sociedad al borde de la
des-razón. Vamos a intentar cepillarse los principales puntos críticos o
importantes transformaciones de estas variables, que coincidió con los cambios
más radicales en la sociedad. Esperamos que en lugar de párrafos concluyentes,
nuevos temas para ser estudiado y discutido y para muchos todavía no tienen
respuestas. Esto es un trabajo en progreso y por esta razón todavía no tienen
las conclusiones finales. Al mismo tiempo, tratar de entender por qué estos
títulos (conceptos) tiene todo que ver con una sociedad al borde del des/razón.
Palabras clave: Educación, arte, imagen, Iglesia Católica,
Introdução
Tentaremos pincelar as principais fases
críticas e/ou significativas de transformações das variáveis propostas no
título desta apresentação: Memória, Imagem, Religião, Educação, as quais
coincidiram com mudanças mais radicais da sociedade. E, ainda, entender como
elas funcionam como uma herança de uma sociedade no limiar da (des)razão. Esperamos,
até, que ao invés de parágrafos conclusivos, surjam novas questões a serem
estudadas e debatidas. Sabemos que para muitas ainda não temos respostas. Por
compreender que esses títulos (conceitos) tem tudo a ver com a sociedade
contemporânea, não pretendemos discorrer sobre elas isoladamente, mas, tentar
pinçar aspectos históricos críticos nos quais essas variáveis se movimentaram,
na teia de relações que move a história. Como se tratam de conceitos cuja
definição histórica é um pouco imprecisa, a explicação começa lá de trás, de
tempos remotos, quando a história dos homens era narrada, de memória, na Grécia
Arcaica, como exemplo do que aconteceu em todas as sociedades antigas orientais
e ocidentais.
Recorremos à narração da Teogonia, de Hesíodo (1991, p.69), para explicar o nascimento da
Memória, musa decorrente da quinta união de Zeus, mas, deveras importante,
também, é observar as obras atribuídas a Homero (Ilíada e Odisséia),
principalmente a Ilíada, na qual a narrativa do episódio faz parte de uma
narrativa maior que explica acontecimentos de antes e de depois da guerra de
Tróia. Não cabe, no presente texto, discutirmos a assim chamada ‘questão
homérica’ a qual discute a autoria ou não de Homero nos épicos Ilíada e Odisséia (PEREIRA, 1987).
Por que é importante observar a Ilíada?
Primeiro porque, antes do texto escrito, a mencionada guerra era narrada de
memória (haja vista a estruturação dos textos), passando, só depois, à
narrativa escrita (PEREIRA, 1987), em versões consequentes. Narrativa que
explica a estreita relação entre os deuses do Olimpo, os semideuses e os
humanos. No seu tempo, os gregos, aos poucos, organizaram um imaginário
sistematizado ─ um panteão ─ no qual os deuses (criados por eles, é claro)
possuíam as virtudes e os defeitos humanos. Os homens, por sua vez, possuíam ou
tentavam possuir atributos e beleza divinos (HESÍODO, 1991).
Foram três gerações de deuses, a princípio
assemelhados a animais ou a forças da natureza, mas que, aos poucos foram
adquirindo forma, sentimentos e emoções humanas. E a convivência entre esses
deuses e os humanos nem sempre era pacata. Muitas vezes se estranhavam,
principalmente quando Zeus se transformava em touro, ganso, ou chuva de ouro
para conquistar uma mortal, que, por sua vez, passava a ser vítima dos ciúmes
da esposa de Zeus.
Essa relação tão estreita entre homens e
deuses determinou a filosofia, visão de mundo, religião e educação e forneceu
elementos de forma e conteúdo para as diversas modalidades artísticas na Grécia
Continental, nas ilhas e na costa asiática. Ou seja, o panteão guardado na
memória dos primeiros poetas/historiadores, foi transplantado do imaginário
cultural para as imagens dos templos, esculturas, pinturas, altos e baixos
relevos, vasos, etc. ─ plasmados em argila, madeira, pedra, gesso, mármore,
bronze e tintas.
Assim, ao lado da cristalização dessas
imagens verbais iniciadas na mitologia e na memória oral (BRANDÃO, 2010),
passando para a narrativa escrita (filosofia, tragédias e comédias), e daí para
a história, surgem, aos poucos, modalidades de imagens plásticas (FRANCASTEL,
1973) com um grau de sofisticação até hoje não superado nem mesmo pela imagem
computadorizada. No caso da imagem plástica (e artística), técnica, forma,
conteúdo andavam juntos.
Eram indissociáveis, mas, podemos dizer que o
conteúdo das imagens plásticas legadas pelos gregos foi de teor estritamente
religioso, ou seja, primeiro reproduziu os fatos mais arcaicos da mitologia
(teogonia, guerras, sedução, castigos, redenções, advindos do período arcaico),
depois reproduziu as sucessivas gerações dos deuses do Olimpo, na sua versão
clássica e, finalmente, a simbiose entre a mitologia grega e outras mitologias,
no período helenístico. Poderíamos dizer, ainda que a forma das imagens
plásticas, especialmente, evoluiu com a cultura arcaica, clássica e
helenística, e os gregos, por força das suas crenças, tentaram e conseguiram
(em cenas mitológicas e guerreiras) representar a perfeição dos deuses do
Olimpo. Para isso, escolhiam os jovens mais belos das academias da cidade, e os
adultos mais possantes.
Por fim, diríamos que a técnica foi evoluindo
na medida do conhecimento do material, do uso do mármore e do bronze, do
desenho geométrico, dos teoremas, do cálculo, da geometria e da arquitetura.
Além disso, também tinha como mola propulsora o desejo da perfeição. O
retângulo áureo, as espirais, as volutas e o dáctilo eram os principais cânones
(medidas) usados. A incorporação da cultura grega pelo Império Romano se, por
um lado, permitiu uma sobrevivência maior a um estilo greco-romano, por outro
lado, inaugurou imagens nas quais os deuses passaram a dividir o protagonismo
com figuras reais e imperiais (representações de Teodósio, Marco Aurélio, Júlia
etc.), sacerdotes, senadores, centuriões e, até mesmo do padeiro ou do
guerreiro, caso estes cidadãos contratassem o artista. As esculturas,
arquiteturas e pinturas romanas continuaram a utilizar o procedimento técnico
dos gregos (na forma e no conteúdo), ou seja, o retângulo áureo, o dáctilo, as proporções, técnicas
escultóricas, etc., mas, os motivos inspiradores já eram outros.
Para sermos mais
precisos, vale afirmar que, além das cópias de esculturas e templos gregos, os
romanos esculpiam suas próprias personagens. Na arquitetura, introduziram o uso
do arco pleno (também chamado de arco romano ou de meia-volta). O arco pleno,
maiormente, possibilitou a construção de espaços fechados mais amplos, como o Panteão,
além de pontes, aquedutos e arcos do triunfo, todos elementos de conquista e
expansão do Império Romano.
No processo de
expansão do Império Romano para o norte da África e para o Oriente, com a
incorporação do monoteísmo judaico e mais tarde do cristianismo, o vínculo
entre essas variáveis culturais: memória, imagem, religião e educação se tornou
cada vez mais estreito exatamente por se tratar de um momento de crise, com a consequente
incorporação do cristianismo pelo Império Romano, do qual se tornou religião
oficial. Conforme declarou Daniélou (1984 p.149): ‘Podemos dizer que o Oriente invade
tanto o mundo greco-romano, quanto a cultura greco-romana invade o Oriente. Na
realidade as duas afirmações não se situam no mesmo plano. No plano religioso,
são as religiões orientais que triunfam; no plano cultural é o helenismo’.
Além do que, como já foi dito, sabemos que,
ao lado dos pensamentos dos filósofos fundadores do racionalismo grego,
aconteceu o nascimento do estoicismo (MARCO AURÉLIO, 1969) e este, junto com o
neoplatonismo formaram a fonte inspiradora dos primeiros apologetas cristãos e
dos primeiros doutores da Igreja (AGOSTINHO, 1984). Não seria incorreto dizer
que, a partir de então os títulos desta mesa temática: Memória, Imagem,
Religião e Educação andaram juntos na teia de relações sincrônica e diacrônica
que movimenta a história dos homens, e nunca mais se separaram.
Tomando como referência o cristianismo,
observamos que, enquanto este se tratava de uma religião nova e perseguida,
suas imagens se limitavam a cenas bíblicas (como a do Cristo representado como
Bom Pastor, a Santa Ceia, ou a do Cristo Rei), localizadas nas catacumbas ou em
lugares ermos (primeiras ermidas), por serem proibidas oficialmente. Eram
imagens destinadas a manter viva a memória de Cristo, a evangelizar e,
portanto, a educar.
Devido às necessidades de evangelização,
decorreu, a seguir, uma inserção gradual dos cristãos ao sistema político do
Império Romano, culminada com o Edito de Milão (313), quando Constantino
concedeu aos cristãos a igualdade de direitos com outras religiões. Com isso,
porém, a Igreja primitiva deixou, paulatinamente, de ser a igreja das
catacumbas, dos mártires e dos perseguidos e passou a ser a igreja das
basílicas, e do poder. Isso se deu em um processo secular.
Aconteceram, consequentemente,
mudanças da educação religiosa inicial que, apesar de conservar os mesmos
conteúdos doutrinários, e de se basear, ainda, na palavra de Cristo e nos
ensinamentos bíblicos, recebeu, em cada contexto ou conjuntura histórica, uma
nova orientação, se bem que proveniente do cerne inicial. Ao lado do
crescimento do cristianismo, entretanto, subsistiam as crenças e sacrifícios
votivos aos deuses pagãos. E isso não acontecia sem conflitos, de ambas as
partes. Além dos movimentos heréticos.
Com o Edito de Tessalônica (390) e a
oficialização do Cristianismo por Teodósio, a educação cristã passou, em grande
parte, a ser uma imposição do Estado. Então, como qualquer outra, desenvolveu
uma organização pedagógica mais sofisticada, na qual, além de métodos,
conteúdos catequéticos e muitas imagens evangélico-pedagógicas, organizou, paralelamente, uma liturgia específica,
instrumentos de controle, disciplinas e castigos. A partir do terceiro século,
intensificou-se mais ainda a atividade intelectual da Igreja, irradiando a
pedagogia cristã no mundo oriental e ocidental. Nesse período, surgiram algumas
obras de catequese, fundamentais para se compreender a evolução da Teologia
Moral, as normas de conduta e a pedagogia religiosa cristã, devido a padres
como Cirilo, Basílio Magno, Santo Agostinho e outros.
Se a Teologia moral dos Primeiros Padres foi
baseada nos Evangelhos, podemos dizer que um dos veículos mediante o qual eles
conheceram o Evangelho, nos primeiros tempos, foi a memória e a tradição.
Irineu, Bispo de Lião, na Gália, em 177 d.C., por exemplo, participou do
círculo de Policarpo de Esmirna o qual, por sua vez, afirmava ter mantido contato
com o Apóstolo João e com outras testemunhas de Cristo.
Para esses primeiros doutores da Igreja,
versados em latim, grego, aramaico e outras línguas, e profundos conhecedores
da filosofia grega, mormente o neoplatonismo, era possível compreender os
dogmas de fé cristãos, mas, para a maioria dos cristãos, para catecúmenos e
neófitos na fé que necessitavam dos rudimentos da evangelização, o mais eficaz
instrumento pedagógico foram as imagens sagradas.
Destarte, por toda a Idade Média,
Renascimento e boa parte da Idade Moderna, a importância da imagem esteve
ligada à necessidade de guardar a memória do cristianismo por meio da história
bíblica. Era, pois, uma ideia de imagem educativa, de eficiente função didática
─ e, por isso, mesmo cuidadosa com o conteúdo, forma e técnica. E graças a essa
preocupação, o Cristianismo das catacumbas se transformou no Cristianismo dos
Mosteiros, Palácios Episcopais e Catedrais, adornadas ricamente, em todos os
seus espaços vazios, por dentro e por fora, com cenas da bíblia, dos mártires e
dos santos, inclusive dos primeiros Padres Doutores por meio de imagens
plásticas imortalizadas em pinturas, relevos, esculturas, tapeçarias, iluminuras
etc.
Do mesmo modo como a
Idade Média havia presenciado, paulatinamente, a supremacia da Igreja sobre os
poderes temporais, presenciou, depois, lentamente, a compartimentação desse
poder eclesiástico com os senhores feudais, com as monarquias nascentes e com
os estados nacionais. Contudo, no âmbito pedagógico, até a Idade Moderna, a
Igreja reinou soberana, uma vez que era a principal detentora dos saberes da
Antiguidade, preservados e recopiados em seus monastérios.
A pedagogia dessa época,
composta de conteúdos filosóficos e teológicos, a preservação da cultura
greco-latina nos mosteiros medievais, o exercício das disputas teológicas, a
contemplação espiritual e o ascetismo monacal dos religiosos geraram saber,
monopólio do conhecimento e, consequentemente, poder. Tudo isso ilustrado com
imagens proselitistas que não deixavam dúvida sobre a existência de Cristo.
Neste interregno, começaram a surgir as primeiras instituições escolares.
Rômulo de Carvalho (1996) se refere a essas instituições iniciais como escolas
paroquiais, escolas monasteriais e escolas catedralícias.
Ao lado desse poder
alcançado pelo saber, surgiu um complicado aparato simbólico em que os
sacramentos, a excomunhão, a beatificação, a canonização, as indulgências
plenárias e, principalmente, os sermões e as imagens plásticas foram
instrumentos pedagógicos tão eficazes quanto os exércitos armados —
contribuindo, em grande parte, para a perpetuação dessa situação soberana, até
o Renascimento e, na Península Ibérica, até o Iluminismo.
O Olhar
Renascente: pintura e experiência social na Itália da Renascença Michael Baxandall assegura que “uma
sociedade desenvolve suas próprias capacidades e seus próprios hábitos, os
quais têm uma dimensão visual [...] e essas capacidades e hábitos visuais
tornam-se parte integrante do meio de expressão do artista” (BAXANDALL, 1991).
A Itália Renascente foi extremamente
religiosa e as imagens dos artistas da pré-renascença e do curto período
chamado Renascença veicularam estreitamente as variáveis do nosso título, uma
vez que a memória dos sermões pregados nas igrejas cristãs eram os motivos das
encomendas dos mecenas e fonte de inspiração para os artistas. Estes pintavam
imagens da anunciação, da crucificação, da ascensão de Jesus e da Assunção de Maria
aos céus com mais ou menos azul da Prússia para o manto de Maria, ou com mais
ou, a depender da quantidade de dinheiro gasta pelo mecenas.
Assim como o olhar ‘renascente’ estaria
envolvido pela presença de imagens materiais (formas, cores, medidas, corpos,
gestos, figuras, comportamentos, etc.) e mentais (percepção, conhecimento,
moralidade, espiritualidade, atitudes etc.), o mesmo se daria com o olhar
barroco. Esta tese explica aquilo que alguns autores chamaram de ‘espírito de
época’ ao se referirem à homologia existente entre as diferentes modalidades
artísticas e os fatos sociais de uma mesma época. Esse espírito é muito
sintomático quando se trata de identificar as características barrocas.
O Barroco foi uma das mais bem sucedida
manipulação da imagem, tanto com a intenção pedagógica como ideológica, na
história da arte. Esta estética expressou-se mediante várias linguagens
artísticas mantendo, porém, uma unicidade que a tornou facilmente reconhecível.
Na expressão da linguagem verbal, o barroco desenvolveu-se em várias vertentes,
principalmente no campo da oratória sagrada, onde não só se destinava a comover
e a persuadir para a fé, mas brotava das necessidades da colonização no Brasil.
Resumia-se, na maioria das vezes, na catequese do índio e na edificação do
colono, segundo as normas doutrinárias da Igreja Católica. Diz Massaud Moisés
que o discurso barroco, por meio dos sermões, e comunicando-se diretamente com
os espectadores, “permitia a fácil transmissão do catecismo; facultava, mais do
que o teatro, o acesso à consciência individual e grupal, e a transfusão de
doutrinas básicas” (1983 p. 195).
O discurso barroco conservava ou reproduzia
as mesmas características formais das artes plásticas com o uso de palavras
incomuns, termos eruditos, latinismos, desdobramentos e abundante uso de
figuras de linguagem, e com características psicológicas manifestadas nas
ambivalências semânticas, no jogo lúdico das palavras, na dramaticidade e na
tragicidade, no emprego persuasório das palavras, nos contrastes violentos, e
nas ambiguidades. Totalmente imbuído desse ‘espírito’ barroco, Vieira, Antonil
e Jorge Benci, dentre outros, vão fazer uso dessa estética ao pronunciar e
escrever os seus sermões.
No barroco, conteúdo e forma se confundem.
Isto é, a forma dá ênfase ao conteúdo, e o mesmo conteúdo facilita a forma
barroca. Na literatura, se confundem mais ainda. Neste sentido, a linguagem
barroca usada pelo autor diz bem do seu proselitismo, da sua crença nas ideias
que apregoa, diferentes, por exemplo, dos textos dos iluministas e liberalistas
que, embora sejam da mesma época, tendem para uma forma de expressão mais
despojada, e mais racional. Diferem na forma e no conteúdo, portanto.
As categorias
plásticas e formais que mais caracterizaram o barroco foram: a intensa
movimentação conseguida com o predomínio das linhas diagonais; os contrastes
entre o claro e o escuro; os movimentos de torção; as vestes esvoaçantes; as
curvas; a sinuosidade; o côncavo e o convexo; as ondulações; o excesso
ornamental; a unicidade dos elementos; o pictórico; a profundidade; os
contrastes violentos. A essas categorias formais corresponderam categorias
psicológicas ou reveladoras de sentimentos e sensações como: dinamismo; ambiguidade;
redundância; lirismo; sensualidade; dramaticidade; exuberância; exagero;
extravagância; tensão, dentre outras.
Essa situação perdura
na encruzilhada de estilos que caracterizou o século XIX e que comporta tanto
neoclássicos, neogóticos, rococós e românticos, como, a partir da segunda
metade do século, o impressionismo e os ismos dele decorrentes. Tal século
inaugura e consolida a ideia da função estética da imagem em detrimento da
função religiosa e didático/pedagógica.
A imagem, então, na
Pós-Modernidade, totalmente divorciada da Religião e da Educação passa a ser
analisada e explicada, primeiramente pela análise estética formal; Em segundo
lugar pela análise estética sociológica; E, finalmente, pela análise estética
semiótica, que, inclusive, dilata o conceito do que é arte.
Além disso, se os
ismos, primeiros movimentos de arte moderna significam, por um lado, a
libertação pelo artista da figura do mecenas significa, por outro lado, o
cativeiro da crítica (que aprova ou condena) e a subordinação do artista ao
mercado de arte (que, a depender da crítica, pode comprar ou não comprar).
Não resta dúvida de
que a massificação da imagem, artística ou não, contribuiu para a popularização
das imagens tanto na mídia quanto nos livros escolares e nos recursos
audiovisuais usados em sala de aula. A informática, os objetos de comunicação
e-ou midiáticos de bolso, contribuíram em progressão geométrica ainda em
crescimento vigoroso, e sem prazo final.
Palavras finais
Ao invés de conclusão, algumas palavras
finais nos levam a considerar que numa sociedade no limiar da des/razão, ao
contrário da memória como era guardada pelas sociedades surge uma memória
adjetivada como memória distorcida, memória imposta, memória silenciada,
memória ideologizada ─, portanto, uma des/memória. Consideramos ainda que a
imagem, massificada tanto pelo produtor como pelo consumidor, ganha a
fotografia, ganha o cinema e, finalmente, ganha a imagem televisiva e a
digitalização. Deixa, portanto de ser uma guardiã da memória, passando a ser
importante aparelho ideológico imagético ─, portanto uma des/imagem. Em uma
sociedade no limiar da des/razão, a religião, perde o sentido de ‘religação’
com o sagrado e os princípios básicos ancestrais, passando a ser mercadoria
veiculada em mídia, com indulgências compradas e pagas com dízimos mensais –
portanto uma des/religião. Finalizando, numa sociedade no limiar da des/razão,
observamos o maior grau já visto de coisificação do homem, destruição da
natureza, da infância, da adolescência, estratégias de sobrevivência fora da
lei – portanto uma des/educação.
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