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MANIFESTO DIRIGIDO À NAÇÃO PELOS ALUNOS DA
FACULDADE DE DIREITO DA BAHIA”, DATADO DE 3 DE NOVEMBRO DE 1897
Ruy Medeirosi UESB
“Os signatários da presente publicação, alunos
da Faculdade de Direito da Bahia, tendo até agora esperado embalde que alguma
voz se levantasse para vingar o direito, a lei e o futuro da República,
conculcados e comprometidos no cruel massacre que, como toda a população desta
capital já sabe, foi exercido sobre prisioneiros indefesos e manietados em
Canudos, e até em Queimadas; e julgando ao mesmo tempo que, nem por haver
cumprido um dever rigoroso, é licito ao soldado de uma nação livre e civilizada
colocar-se acima da lei e da humanidade, postergando-as desassombradamente: -
vêm declarar perante os seus compatriotas – que consideram um crime a jugulação
dos míseros conselheiristas aprisionados, e francamente o reprovam e condenam,
como uma aberração monstruosa, que se chegasse a passar sem protesto, lançaria
sobre o nome da pátria o mesmo laivo de sanguinolenta atrocidade que, repelido
pela bandeira cristã de Menelick – o africano – assenta hoje vergonhosamente
sobre a emperrada barbaria do crescente otomano. Os alunos signatários sabem
que seria impolitico e errado a proceder de uma república que, imitando a
antiga Atenas, perseguisse os seus guerreiros de volta da batalha arriscada;
mas compreendem também, por outro lado, a grave necessidade de que uma geral
reprovação caia como raio de justiça inflexível sobre aquele morticínio
praticado talvez na inciência das leis sagradas, que protegem na culta
república brasileira a vida sempre respeitável de um preso manifestado e sem
defesa. O Brasil republicano só há de prosperar quando estiverem consolidados
certos hábitos, certas práticas indispensáveis ao seu desenvolvimento normal; a
história da república atravessa o período da consolidação dos costumes. Urge
que, em vez de deixa-las, como um precedente funestíssimo, profliguemos todas
as injustiças, todas as ilegalidades, com a serena sobranceria de quem se sente
apossado pela razão e o direito. Urge que estigmatizemos as iníquas degolações
de Canudos, para que todos se convençam, para que fique indestrutivelmente assentado
– que a república, como qualquer governo civilizado do século XIX, repele com a
mesma indignação e o mesmo horror a série intensa das oblações sanguinárias,
desde o holocausto desnaturado de Brutus até o guilhotinamento em massa dos
ferozes republicanos de 1789. Nos tempos de Caracala, a prioridade das
reinvidicações que o direito não desdenha, mesmo quando intentadas em geral da
causa de miseráveis mortos, era reclamada como uma honra pelos Papinianos
incorruptíveis. Hoje, que os brasileiros se vangloriam de possuir cultura igual
á dos mais adiantados povos progressistas, seria uma vergonha sintomática de
maiores aviltamentos para o futuro, se a consciência nacional, acobardada,
emudecesse diante dos responsáveis pelos trucidamentos de Canudos e Queimadas.
Combatendo naquelas paragens pelo restabelecimento da soberana autoridade das
leis, ninguém tinha lá o direito de desprezá-la erigindo-se, fora da luta, em
supremo árbitro da vida e da morte, quando a própria majestade da república não
recusa ao mais miserável e torpe dos seus prisioneiros o sacratíssimo e
iniludível direito de defesa. Aquelas mortes pela jugulação foram pois uma
dehumanidade sobreposta á flagrante violação da justiça. Já não há Caracalas; e
se os houvera, os alunos signatários, quebrando embora a estrondosa harmonia
dos hinos triunfais, e o concerto atroador das deificações miraculosas,
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cumpririam apesar deles, o seu dever,
proclamando as palavras de justiça e de verdade que aí ficam, e que,
porventura, concorrerão para impedir no futuro a triste renovação de
semelhantes atrocidades – Faculdade de Direito da Bahia, em 3 de Novembro de
1897”.
CONSIDERAÇÕES
ACERCA DO MANIFESTO ESTUDANTIL CONTRA A DEGOLA
“Chegando à primeira canhada encoberta,
realizava-se uma cena vulgar. Os soldados impunham invariavelmente à vítima um
viva à República, que era poucas vezes satisfeito. Era o prólogo invariável de
uma cena cruel. Agarravam-na pelos cabelos, dobrando-lhe a cabeça,
esgargalando-lhe o pescoço; e, francamente exposta a garganta, degolavam-na.
Não raro a sofreguidão do assassino repulsava esses preparativos lúgubres. O
processo era, então, mais expedito: varavam-na, prestes, a facão.[...] Um golpe
único, entrando pelo baixo ventre. Um destripamento rápido [...] Tínhamos
valentes que ansiavam por essas covardias repugnantes, tácita e explicitamente
sancionadas pelos chefes militares.
Apesar de três séculos de atraso os sertanejos
não lhes levavam a palma no estadear idênticas barbaridade .(Euclides
da Cunha – Os Sertões, p. 726, Edição Crítica de Leopoldo M. Bernucci,
Ateliê Editorial, Arquivo do Estado, Imprensa Oficial de São Paulo, São Paulo,
2002).
As mais das vezes as histórias da educação não
contemplam os estudantes, ou os contemplam como grupo passivo. No entanto,
esses estiveram presentes em momentos considerados importantes para a História
do Brasil: na luta pela Emancipação Política, na Abolição da Escravatura, na
Proclamação da República, na Revolta Paulista de 1932, na luta contra o Estado
Novo e a ditadura militar imposta em 1964, dentre outros processos/eventos.
Os estudantes foram críticos da escola que tinham
em cada geração. Aqui e ali pululam, em livros de memória a crítica estudantil,
com poder de mudança ou com a contrapartida da repressão no âmbito do próprio
estabelecimento de ensino. Contra ou à revelia de seus mestres, estudantes
deixaram fortemente impressos seus protestos, suas análises, suas críticas e
posições. Sua intervenção era intra e extramuros. Difícil, assim, imaginar a
História da Educação sem aqueles, mesmo quando se trata de denunciar o
conformismo às regras por parte dos discentes.
“O Manifesto dirigido à Nação pelos Alunos da
Faculdade de Direito da Bahia”, datado de 3 de novembro de
1897, há um século, portanto, é imprevisível face às condições de celebração da
vitória sobre o Arraial de Canudos, e merece algumas considerações. Quando a
luta do Estado Brasileiro contra o Arraial de Canudos alcançava seus últimos
dias, prisioneiros conselheiristas foram barbaramente degolados. Os estudantes
da Faculdade de Direito da Bahia, em 3 de novembro de 1897, protestaram, em
manifesto escrito, contra a degola dos prisioneiros seguidores de Antonio
Conselheiro: “Manifesto Dirigido à Nação pelos Alunos da Faculdade de
Direito da Bahia”, transcrito ao final do presente escrito.
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A Faculdade de Direito da Bahia, instalada em 15
de abril de 1891, por iniciativa particular, somava-se às faculdades de Direito
de Recife e São Paulo, oficiais, criadas em agosto de 1827, na preparação de
bacharéis, que tanta importância tiveram na história nacional. Predominavam, na
época, idéias evolucionistas no trato da compreensão do Direito, especialmente
adaptações ao campo jurídico das idéias de Spencer e Haeckel, tal como
acontecia na Faculdade de Direito de Recife, sobretudo, e de São Paulo, nesta
última com acréscimo de outras matrizes.
A
cadeira de Filosofia de Direito, substituída posteriormente pela de
Enciclopédia Jurídica, era campo privilegiado da teoria do Direito e motivadora
de polêmicas. Seu primeiro professor, na Bahia, foi Leovigildo Ipiranga Amorim
Filgueiras, autor de “Estudos de Filosofia do Direito”, formado
pela Faculdade de Direito de Recife, em 1878. Em seu discurso, na
instalação da Faculdade, em 1891, Leovigildo Filgueiras, defende a idéia geral
de que “considerada, pois, a evolução do
conjunto do seu movimento histórico, vemos que reproduz perfeitamente os
caracteres gerais que distinguem o desenvolvimento social, isto é, o predomínio
progressivo dos fatores históricos sobre os naturais, a eficácia cada vez mais
freqüente das energias ideais acumuladas no curso do tempo e a parte maior que
tomam a reflexão e a vontade. Daí vem que, à medida que se eleva o grau de
inteligência e da cultura, a consciência coletiva elaboradora do direito vai
adquirindo uma idéia mais
clara, mais ampla e, sobretudo mais reflexa
das condições de existência e dos fins por estas determinados” (apud
Almachio Diniz – O Ensino do Direito da Bahia, p. 20/21, Editora Alba,
Rio de Janeiro, 1928).
O
evolucionismo também é a marca de Almachio Diniz, crítico e sucessor de
Leovigildo da Cátedra de Filosofia. Para este “as leis desse transformismo
social, da evolução das
sociedades, em nada, podemos assegurar,
variam das que regem o evolucionismo do homem, no mundo físico” (Ensaios
Filosóficos sobre o mecanismo do Direito, p. 27, Tipografia Baiana,
Salvador, 1906). Também nas Faculdades de Direito de Recife era predominante a
visão evolucionista do Direito, a exemplo das lições do então professor Martins
Junior. A lição evolucionista e o pensamento jurídico nela fundado dão o tom do
manifesto dos acadêmicos de Direito contra a degola: não é lícita a prática de
trucidamento numa “nação livre e civilizada”, não se pode calar diante dos
responsáveis pelos trucidamentos, quando “os brasileiros se vangloriam de
possuir cultura igual à dos mais adiantados povos progressistas”, e
o emudecimento seria vergonhoso.
O repúdio à degola dos prisioneiros, de fundo
evolucionista, fundamenta-se em bases jurídicas: a) predomínio da lei e da
idéia de humanidade (caras ao jusnaturalismo liberal e que foi mantida
posteriormente por diversas doutrinas jurídicas); b) a degola dos prisioneiros
foi um crime; c) o progresso ocorre como conseqüência de adoção de hábitos e
práticas, indispensáveis ao desenvolvimento normal; d) respeito ao direito de
defesa por parte do acusado; e) dever de denúncia. Tais princípios eram cerne
corrente das idéias jurídicas de então, inclusive a persistência da idéia de
Justiça, que não se contém apenas na lei e na razão de estado.
O
princípio do predomínio da lei, que a todos obriga, inclusive governantes, é o
fundamento inicial do repúdio dos estudantes, uma razão jurídica: “... nem
por haver
cumprido um dever rigoroso, é lícito ao
soldado de uma nação livre e civilizada colocar-
se acima
da lei e da humanidade, postergando-a desassombradamente”. Aí, a
idéia de submissão à lei (ninguém sequer pode descumprí-la alegando
desconhecê-la), sem atentar
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sequer que a lei pode ser usada como instrumento
de opressão, e que o Direito envolve proteção de interesses de classe e que não
há homologia entre lei e humanidade (no sentido de humanitarismo). Há, no
manifesto, articulação de liberdade, justiça e civilização, coisa persistente
na história da teoria do direito. Já na segunda metade do Século XX, Dennis
Lloyd disse:
“A lei é uma das instituições básicas da
natureza social do homem sem a qual ele seria uma criatura muito diferente. Um
simples olhar de relance ao índice deste livro deve ser suficiente para indicar
ao leitor as vastas áreas de pensamento e ação em que a lei desempenhou e
continua desempenhando um papel de destaque nos assuntos humanos. Importantes
filósofos, de Platão a Marx, podem ter alegado que a lei é algo ruim de que a
humanidade faria muito bem em livrar-se. Entretanto, apesar de todas as dúvidas
filosóficas, a experiência mostrou que a lei é uma das grandes forças
civilizadoras na sociedade humana, e que o desenvolvimento da civilização
esteve geralmente vinculado ao
gradual desenvolvimento de um sistema de
normas legais, em conjunto com os mecanismos para sua observância regular e
efetiva”. (Lloyd, Dennis – A idéia de Lei, prefácio,
Martins Fontes, São Paulo, 2000).
Os
acadêmicos de direito consideram, em seu manifesto, a degola dos prisioneiros
um crime (e o era pela lei do tempo e pela lei atual): “Vêm declarar perante
os seus
compatriotas
– que consideram um crime a jugulação dos míseros conselheiristas aprisionados,
e francamente o reprovam e condenam”, mas julgam ser
“impolítico e
errado o proceder de uma república que...
perseguisse os seus guerreiros de volta da batalha arriscada...” Querem
aqueles estudantes “uma geral reprovação que caia como raio de justiça
inflexível sobre aquele morticínio”. Interessa anotar que a reação em muito
se perdia diante do aplauso da imprensa e das manifestações de apoio à
vitória de exército brasileiro contra Canudos, fato que o valoriza aos olhos
atuais. No contexto da época, o manifesto era quase uma voz isolada e demonstra
compreensão (apesar da ideologia que o permeia) de que houve crimes, em Canudos,
praticados pelos vencedores. Antonio Olavo, sobre os crimes praticados pelos
vencedores de Canudos diz:
“Sobre a degola, como regra, predominou o
silêncio no período em que ela foi utilizada amiúde. Aquela que é considerada a
mais contundente denúncia do genocídio praticado em o final da guerra, surgiu
dois anos depois e partiu do acadêmico de medicina Alvim Martins Horcades, que
esteve no palco dos acontecimentos e teve o mérito e a coragem de, mesmo sob
pressão, fazer um depoimento que embora tardio, foi definitivo: Eu vi e assisti
a sacrificar-se todos aqueles miseráveis [...] e com sinceridade o digo: em
Canudos foram degolados quase todos os prisioneiros [...] levar-se homens de
braços atados para trás como criminosos de lesa-majestade, indefesos, e perto
mesmo de seus companheiros, para maior escárnio, levantar-se pelo nariz a
cabeça, como se fora a de uma ave, e cortar-lhe com o assassino ferro o
pescoço, deixando cair a cabeça sobre o solo – é o cúmulo do banditismo
praticado a sangue frio como se fora uma ação nobilitante! Assassinar-se uma
mulher, pelo simples fato de ser o seu companheiro conivente com o que se dava
– é o auge da miséria! Arrancar-se a vida a criancinhas que ainda não haviam
sentido o mais leve bafejo da ação corruptora do humanismo, cérebros
inconscientes em que não haviam vibrado ainda sentimentos maus e que mais tarde
concorreriam para solidificar a muralha
pujante
que sustenta as crianças republicanas – é o maior dos barbarismos e dos crimes
monstruosos que o homem pode praticar!” (Olavo,
Antonio – Apresentação, in - Histórico
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Relatório do Comité Patriótico da Bahia (1897-1901), Coordenado por Lelis
Piedade, 2ª edição Organizada por Antonio Olavo).
O Manifesto entende
que “O Brasil
Republicano só há de prosperar
quando estiverem
consolidados certos hábitos, certas práticas
indispensáveis ao seu desenvolvimento normal” e
ressaltam o direito de defesa, direito fundamental, que aparece nas diversas
legislações como algo infastável: a “própria majestade de República não
recusa ao mais
miserável
e torpe de seus prisioneiros o sacratíssimo e ineludível direito de defesa” e assumem
o dever de denúncia dizendo que “aquelas mortes pela jugulação foram pois
uma desumanidade sobreposta à flagrante
violação da justiça. Já não há Caracalas; e se os houvera, os alunos
signatários, quebrando embora a estrondosa harmonia dos hinos triunfais, e o
concerto atroador das deificações miraculosas, cumpririam, apesar deles, o seu
dever, proclamando as palavras de justiça e de verdade que aí ficam, e que,
porventura, concorrerão para impedir no futuro a triste renovação de
semelhantes atrocidades”.
Veja-se que os estudantes de Direito estão cientes de que
quebram a “estrondosa harmonia
dos hinos triunfais e o concerto atroador das
deificações miraculosas”. Aí há como que, em
documento da época, a confirmação daquilo que Antonio Olavo afirmara sobre os
crimes cometidos pelo Exército em Canudos: “predominou o silêncio”.
Quando o manifesto dos estudantes da Faculdade de Direito foi redigido (3 de
novembro de 1897), Canudos já estava prestes a cair. Euclides da Cunha anotou:
“Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda
a história, resistiu até ao esgotamento completo. Expugnado palmo a palmo, na
precisão integral do termo, caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram os seus
últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois
homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil
soldados [...] Forremo-nos à tarefa de descrever os seus últimos momentos. Nem
poderíamos fazê-lo. Esta página, imaginamo-la sempre profundamente emocionante
e trágica; mas cerramo-la vacilante e sem brilhos [...] Vimos como quem vinga
uma montanha altíssima. No alto, a par de uma perspectiva maior, a vertigem
[...] Ademais, não desafiaria a incredulidade do futuro a narrativa de
pormenores em que se amostrassem mulheres precipitando-se nas fogueiras dos
próprios lares, abraçadas aos filhos pequeninos? [...] E de que modo
comentaríamos, com a só fragilidade da palavra humana, o fato singular de não
aparecerem mais, desde a manhã de 3, os prisioneiros válidos colhidos na
véspera, e entre eles aquele Antônio Beatinho que se nos entregara, confiante –
e a quem devemos preciosos esclarecimentos sobre esta fase obscura da nossa
história? [...] Caiu o arraial a 5. No dia 6
acabaram de o destruir desmanchando-lhe as casas, 5.200, cuidadosamente
contadas.” (Euclides da Cunha, Os Sertões, p. 778/779, Edição
crítica de Leopoldo M. Bernucci, Ateliê Editorial, Arquivo do Estado, Imprensa
Oficial de São Paulo, São Paulo, 2002).
Apresentam os estudantes uma denúncia corajosa com
o próprio instrumental da Ordem (O Direito) e da ideologia dominante. Entendem
o trucidamento dos prisioneiros como fato jurídico, como crime à luz do
direito, ato incompatível com o avanço da civilização, ideologicamente como
ensinavam seus mestres e como liam em seus livros. Ousados e corajosos
estudantes denunciavam o crime, no contexto da “estrondosa harmonia dos hinos
triunfais e o concerto atroador das deificações miraculosas”, e, como
Horcades, destoam da maioria das vozes e se afirmam. Mas, entendendo a
degola como crime, os
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não preconizam punição aos criminosos mas uma geral reprovação e, com isso, a
própria coragem autolimita-se.
Mas a questão não se esgotava no seu saber
jurídico. O confronto de Canudos foi algo mais profundo, cuja análise escapa
aos objetivos desse comentário. Reduzí-lo, mesmo que tão só os episódios de
degola, às categorias de análise jurídico evolutiva, como faz o manifesto
estudantil, cumpre papel de denúncia, mas encobre a questão da própria
atrocidade da guerra: o centro é a guerra de massacre do Estado contra
camponeses e não o Direito, que também perdoa com a omissão ou com a anistia
dos genticidas, estabelecendo o tempo do silêncio. Por outro lado,
utilizando-se da ideologia da ordem, mesmo para denúncia, reforçam-na. O
evolucionismo, na sua versão de darwinismo social, foi instrumental e
ideológico dos imperialistas nas chacinas que promoveram pelo mundo,
especialmente em Ásia e África.
FONTE: (O texto do manifesto pode ser encontrado
em Rocha Pombo – História do Brasil, vol. X, p. 431 e seguintes, edição
Benjamim de Aguila, Porto, e em Renato Bahia – O Estudante da História do
Brasil, Livraria Progresso Editora, Salvador, 1954).
i advogado e professor de
Teoria da Constituição na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB
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