quinta-feira, 16 de março de 2017

Da Série O Professor Hemetério e seu detestável Aluno- Oitava Conversa = http://www.blogdopaulonunes.com

Da Série O Professor Hemetério e seu detestável Aluno- Oitava Conversa


O Professor Hemetério leu o texto que havia preparado a pedido da escola de sua rua. “O texto deve ser pequeno, professor, será colocado no mural junto a outros”, avisaram-no. Ele escreveu:
Neste 14 de março, devemos comemorar os 170 anos de nascimento de Antonio de Castro Alves, que nasceu em 1847 e faleceu em 6 de julho de 1871. Viveu pouco, amou muito, e tornou-se o poeta mais lembrado do Brasil.
Aqui eu escrevo sobre um dos atributos do poeta: a generosidade, em verdade, a solidariedade, que perpassa sua poesia e vida, dando pequeno exemplo.
A França foi derrotada na Batalha de Sedan pelas forças da Alemanha, em 01.9.1870. A fome passou a campear na França e as vítimas maiores eram as crianças. Fome. Fome. Franceses criaram o Comitê du Pain (Comitê do Pão) para angariar recursos para os necessitados.
A comunidade e o consulado franceses na Bahia, como em outros lugares, convocaram ato público (meeting) para angariar contribuições para as crianças francesas que passavam fome, para o dia 9 de fevereiro de 1871.
Castro Alves, doente (faleceria no mesmo ano) montou no seu cavalo e de sua residência foi até o distante palacete da Associação Comercial da Bahia, onde o “meeting” seria realizado. Pálido, cabeleira cheia, saltou do animal. Pouco tempo depois, naquele longínquo 9 de fevereiro, pediu a palavra e recitou um dos poemas mais afirmativos da língua portuguesa – “No ‘meeting’ du Comitê du Pain”.
Não transcrevo todo o poema, mas não deixo de mencionar, por ser oportuno para os nossos dias, alguns versos dele:
“Já que o amor transmudou-se em ódio acerbo, / Que a eloquência – é o canhão, a bala – o verbo. / O ideal – o horror! / E nos fastos do século, os tiranos / Traçam co’a ferradura dos ulanos / o ciclo do terror
(……….)
Já que é mentira a voz da humanidade. / Já que riscam da Bíblia a Caridade. / E d’alma o coração. / E a noite da descrença desce feia / E, tropeçando em ossos, cambaleia / Dos povos a razão
(………..)
Filhos do Novo Mundo! Ergamos nós um grito / Que abafe dos canhões o horríssono rugir / Em frente do Oceano! Em frente do infinito / Em nome do progresso! Em nome do porvir.
(………..)
Não; clamemos bem alto à Europa, ao Globo inteiro! / Gritemos liberdade em face da opressão!
Ao tirano dizei: tu és um carniceiro! / És o crime de bronze! – escreva-se ao canhão!
Chiquinho, que apareceu trazendo encomenda de sua mãe para o professor, pescou o texto e foi logo dizendo:
– Professor esse castro Alves já não diz nada para nós.
Ao contrário, Chiquinho, ele diz muito.
Minha amiga Isadora, tua mãe, uma vez disse em palestra: Castro Alves é sempre atual por que cantou o amor, a liberdade, o pão e a solidariedade, e o fez com arte. Nada em seus poemas é supérfluo.
Eu acho mesmo, Chiquinho, que falar de Castro Alves nesses seus 170 anos de nascimento contribui para afastar a pasmaceira que vai tomando conta de nossa cidade. Que a voz do poeta possa ecoar nas ruas: “lançai um protesto, ó povo, / Protesto que o mundo novo / Manda aos tronos e às nações”.
– Agradeço a tua mãe (grande mulher, grande mulher).
– Té logo, professor. Não tô a fim de poesia. Eu quero é a pasmaceira.
14 de julho de 2017 – 170 anos da morte de Castro Alves.

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